São Paulo, sábado, 6 de setembro de 2003

DIVERSÃO

Arte na era dos games

Telas de Tarsila do Amaral vão parar em jogos de computador

MIRNA FEITOZA
ESPECIAL PARA A FOLHINHA

Quem foi que disse que os games só servem para estimular a violência? Projetos desenvolvidos por cientistas estão mostrando exatamente o contrário: os games podem divertir, educar e aproximar as pessoas.
Um desses projetos está levando para o mundo dos games o universo criado por Tarsila do Amaral (1886-1973), artista brasileira que se consagrou como uma das maiores pintoras de todos os tempos ao imaginar, em suas telas, ambientes e personagens da cultura brasileira.
O game "Universo de Tarsila" está sendo desenvolvido no LSI (Laboratório de Sistemas Integráveis da USP), em parceira com o MAC (Museu de Arte Contemporânea da USP).
O projeto terá dois aplicativos: um jogo de computador e um jogo que vai rodar nos computadores da Caverna Digital, uma sala do LSI que simula ambientes de realidade virtual ao projetar imagens nas paredes, no teto e no chão, dando a impressão de que a pessoa que está neste ambiente pode interagir com aquilo que se passa nas imagens projetadas.
No game de Tarsila, o jogador vai navegar em ambientes inspirados nas cores e formas inventadas pela artista, onde encontrará algumas de suas obras, como "Abaporu", "A Lua", "Floresta", "Sol Poente".
"A idéia é que o usuário possa explorar no game ângulos não mostrados nos quadros", diz Leonardo Nomura, designer do projeto. Para isso, os designers do LSI vão construir, por meio de técnicas de computação gráfica 3D, um modo de os jogadores navegarem pelo lado oculto dos quadros de Tarsila.
O jogo está na fase de modelagem dos ambientes. Isto é, "os cenários" dos quadros de Tarsila estão sendo desenhados no computador. Depois será a vez de modelar e animar os personagens da artista. "O mais difícil será fazer ‘Abaporu’. Ainda não sabemos como vamos animá-lo. Estamos pesquisando a personalidade dele", afirma o coordenador do LSI, Marcelo Zuffo.
Os pesquisadores do projeto realmente têm um desafio e tanto. Tarsila fez "Abaporu", em 1928, para dar de presente ao seu marido, na época o escritor Oswald de Andrade. Impressionado com o que viu, Oswald chamou seu amigo, o escritor Raul Boop, para conhecer o trabalho, e os dois concluíram que aquele "homem plantado na terra" representava algo de muito especial sobre a cultura brasileira. Tarsila foi então consultar um dicionário da língua dos índios tupi guarani e viu que "aba" significava "homem" e "poru", "comer". Assim nascia "Abaporu", o "homem que come".
Oswald ficou tão empolgado com tudo aquilo que escreveu o manifesto que deu início a um dos movimentos artísticos mais importantes que o Brasil já teve, o Movimento Antropofágico. Segundo este movimento, a arte moderna brasileira não era aquela que copiava as artes que vinham da Europa. Era aquela que deglutia a cultura européia, ganhando, assim, uma cara bem brasileira, como a de "Abaporu".
O game "Universo de Tarsila" ainda não tem previsão para ficar pronto, mas uma parte dele ganhará sua primeira exibição pública neste mês, em uma instalação em ambiente virtual dentro da exposição "Escrita da Luz Sonhos e Registros", no Museu de Arte Contemporânea, em São Paulo.
Mirna Feitoza é jornalista e estuda o processo de conhecimento da criança na relação com as mídias, em pesquisa de doutorado na PUC-SP.
Você pode ver o ambiente (cenário) do jogo de Tarsila do Amaral, cedido gentilmente pelo LSI. Assista agora a uma prévia do jogo.

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