São Paulo, sábado, 1 de janeiro de 1994
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Itamar poderá inviabilizar Plano FHC

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente Itamar Franco é visto como um obstáculo para o sucesso do plano de estabilização proposto pelo ministro Fernando Henrique Cardoso (Fazenda). Esta opinião é compartilhada pelo ex-ministro Mailson da Nóbrega e pelo ex-secretário de política econômica Antônio Kandir.
Kandir diz que sem recessão os preços jamais vão ser convertidos em URV (Unidade Real de Valor), voluntariamente, pela média. "O presidente já disse que não aceita a recessão em hipótese alguma", afirma. Por isso, nos cenários imaginados pelo economista existe tanto a hipótese de o plano não sair do papel como a de que o governo seja obrigado, unilateralmente, a estabelecer as regras para a conversão dos preços em URV.
Mailson diz que simplesmente não consegue sequer imaginar que o presidente e o ministro do Trabalho, Walter Barelli, enviem ao Congresso um projeto de conversão do salário mínimo pela média. "E isso não é trivial. A conversão tem de ser feita da forma mais neutra possível para que não gere inflação em URV."
Sem paralelo
O ex-ministro elogiou o plano, diz que sua "experiência não tem paralelo no mundo", já que tenta sincronizar os reajustes de preços em um ambiente hiperinflacionário "mas sem produzir os custos de uma híper". Para Mailson, o plano faz uma "hiperindexação", já que vai obrigar, paulatinamente, a que todos os preços tenham correção diária e simultânea. Justamente por isto, segundo ele, é inescapável um aumento da inflação em cruzeiros reais.
A chamada fase dois do plano será um duro teste para a vontade política do governo. "Vai ser preciso muita firmeza, paciência e convicção para que o presidente possa ultrapassar esta fase, que será de muito desgaste. A inflação em cruzeiros reais vai subir, os juros estarão bastante elevados e o nível de atividade não será dos mais brilhantes."
Tudo isto vai acontecer em um momento político crucial: a véspera das eleições gerais. É por isto que o cenário imaginado comporta também uma guerra entre a equipe econômica e os políticos pelo "timming" deste período de transição até a criação da nova moeda. "O Pérsio (Pérsio Arida, presidente do BNDES e um dos formuladores do plano) já disse que preferia um período longo de transição até a nova moeda, mas isto é incompatível com o calendário eleitoral", diz Mailson.
Flexibilidade
O plano já foi pensado para enfrentar este tipo de problema. Por isto ele é flexível. "Pouca gente se deu conta disso. Embora o início seja conhecido, existem vários finais possíveis. Podemos ter uma moeda lastreada ou não, com paridade fixa com o dólar ou não", diz José Roberto Mendonça de Barros. A flexibilidade e uma certa ojeriza ao "tudo ou nada" também foi enaltecido por vários integrantes da equipe econômica. Um deles, que preferiu não se identificar, disse que para cada momento existem sempre várias alternativas técnicas. Ele mesmo disse acreditar que, teoricamente, é pertinente a crítica do ex-presidente do Banco Central, Ibrahim Eris. Eris disse que como a URV ficará atrelada ao dólar, a inflação em URV vai se transformar em atraso cambial. O integrante do governo aponta como uma solução a diminuição da carga fiscal dos exportadores.
Mailson desconfia da avaliação corrente entre os economistas de que, depois de estrebuchar o Congresso vai ceder e aprovar o ajuste. "Quem fala da fragilidade política se esquece que este Congresso é muito fragmentado e vota caso-a-caso", garante o ex-ministro da Fazenda do último período do governo Sarney.

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