São Paulo, sábado, 1 de janeiro de 1994
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Flórida adota discurso antiimigração

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

O governador da Flórida, Lawton Chiles, 63, resolveu processar o governo dos EUA para recuperar os US$ 739 milhões anuais que ele diz estar gastando em despesas com imigrantes ilegais em seu Estado. Ele acusa o governo federal de não cumprir bem sua missão de impedir a entrada no país de estrangeiros e de não repor o dinheiro gasto pelos Estados com eles.
A decisão tem evidentes objetivos eleitorais. Chiles, que pertence ao Partido Democrata e ao mesmo grupo neoconservador que ajudou Bill Clinton a chegar à Casa Branca, vai tentar se reeleger em novembro deste ano. Sua popularidade está mais baixa do que nunca e um de seus possíveis oponentes é filho de George Bush.
Atacar estrangeiros está se tornando atividade cada vez mais popular nos EUA, país com uma das mais sólidas tradições de receber bem imigrantes e que ainda é a nação industrializada que mais os aceita. Só em 1992, 974 mil pessoas imigraram legalmente para os EUA e 240 mil estrangeiros se naturalizaram. Entre 1971 e 1990, 10,5 milhões de imigrantes legais entraram no país.
Segundo pesquisa da revista "Newsweek" de agosto de 1993, 60% dos americanos acham a imigração um mal para os EUA, embora 59% reconheçam que ela já foi um bem. A revista "Time", em setembro de 1993, publicou pesquisa que mostra apoio de 73% dos americanos à imposição de maiores restrições à entrada de imigrantes no país.
Há entre 2,5 milhões e 4 milhões de imigrantes ilegais nos EUA. O governo trabalha com o número de 3,2 milhões. O custo dessas pessoas para os governos federal e estaduais é estimado em entre US$ 7 bilhões e US$ 12 bilhões por ano. Como disse o governador Chiles, este dinheiro é gasto em despesas que vão de policiais a professores de inglês como segunda língua.
Chiles não é o único político americano a atacar estrangeiros para conquistar votos. O governador da Califórnia, Pete Wilson, é a autoridade com cargo mais alto no país a defender emenda constitucional para acabar com o secular direito de cidadania a todas as crianças nascidas nos EUA. Wilson acha que os filhos de imigrantes ilegais não podem ser considerados americanos.
Sua proposta recebeu o apoio de 54% da população da Califórnia, segundo pesquisa publicada em setembro pelo jornal "The Los Angeles Times". A mesma sondagem mostra que 90% dos californianos acham que a imigração ilegal prejudica os interesses de seu Estado e 73% querem a utilização de tropas federais para conter sua entrada no país.
Mas Wilson não chega a ser o mais radical em propostas antiimigrantes. O jornalista Pat Buchannan, que em 1992 desafiou dentro do Partido Republicano a reeleição do ex-presidente George Bush, é o "Jean-Marie Le Pen americano" e muito do inesperado êxito que obteve em eleições primárias de vários Estados se deve ao discurso chauvinista que utliliza.
Um dos motivos para a popularidade desse tipo de retórica é o cálculo que se faz de que 2,1 milhões de americanos estão desempregados porque imigrantes em situação ilegal se sujeitam a receber menos do que o salário mínimo para executar em especial serviços domésticos.
Empresas e cidadãos particulares se valem da condição de ilegalidade do imigrante para economizar em salários e contribuições previdenciárias e poder contar com babás, empregadas domésticas, faxineiros, lava-pratos, motoristas e outros profissionais. O Serviço de Imigração faz ostensivas vistas grossas para este tipo de transgressão e o americano que não consegue se empregar culpa o estrangeiro pelos seus problemas.
No entanto, como demonstram estudos de economistas como Charles Kelly, da Universidade de Georgetown, os imigrantes ilegais geram mais riqueza para os EUA do que despesas para assisti-los e aos seus filhos. Segundo esses estudos, todo o discurso antiimigração é desprovido de base científica e só se sustenta no ódio irracional ao estrangeiro.

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