São Paulo, domingo, 2 de janeiro de 1994
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Decisões do STF apontam limites à revisão

DA REPORTAGEM LOCAL

Duas decisões dadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em dezembro, poucos dias antes do recesso do Judiciário, deixaram claro que o tribunal exercerá controle sobre o processo de revisão constitucional e poderá declarar inconstitucionais emendas aprovadas pelo Congresso. "O poder de rever a Constituição não envolve o poder de destruir a ordem constitucional", disse o ministro do STF José Celso de Mello ao pronunciar o seu voto em um dos últimos julgamentos da Corte.
O controle sobre a revisão poderá trazer à tona a tensão que surge entre o STF e o Legislativo sempre que decisões da Câmara ou do Senado ficam sujeitas à alteração do tribunal.
Uma série de parlamentares criticou o Supremo quando terminou empatado o julgamento do mandado de segurança do ex-presidente Fernando Collor contra a pena de inabilitação para função pública que lhe foi imposta pelo Senado. Em setembro de 92, o deputado Ulysses Guimarães propôs a desobediência ao STF caso o tribunal não confirmasse o voto aberto na votação do impeachment de Collor.
Controle
A consequência mais direta do mal-estar entre o Legislativo e o STF são as inúmeras emendas que criam o controle externo do Judiciário apresentadas ao Congresso revisor. Ironicamente, o futuro das propostas poderá ser decidido pelo próprio Supremo, o que certamente aumentará a temparatura no relacionamento do Legislativo com o tribunal. A condição para a manifestação do STF é que seja apresentada alguma ação questionando a constitucionalidade da emenda eventualmente aprovada.
"Ao julgar o IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira), pela primeira vez o STF considerou inconstitucional uma emenda à Constituição", explica Celso de Mello. Os ministros concluíram que a cobrança do IPMF em 93 feria o princípio da anterioridade, pelo qual um imposto só pode ser cobrado no ano seguinte ao de sua criação. E, mais importante, decidiram que o princípio da anterioridade é uma cláusula pétrea, que não pode ser modificada por emenda.
As cláusulas pétreas estão previstas no parágrafo 4.º do artigo 60 da Constituição, que proíbe a aprovação de emendas que pretendam acabar com os seguintes pontos: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais.
A definição do que são cláusulas pétreas e de qual é sua abrangência será retomada numa eventual ação contra o controle externo do Judiciário. "A grande dificuldade para a criação do controle externo é o princípio constitucional que prevê a separação entre os poderes", observa Celso de Mello, que é favorável à medida.
O outro julgamento em que o STF apontou para o controle da revisão foi o que negou a ação do governador do Paraná, Roberto Requião, que pretendia alterar as regras estabelecidas pelo Congresso revisor. "A maioria dos ministros deixou claro em seus votos que a revisão está sujeita aos mesmos limites impostos ao poder de emendar a Constituição", observa Celso de Mello. E o principal limite é o que proíbe a alteração das cláusulas pétreas.
Pena de morte
O debate sobre a mudança da Constituição e a abrangência das cláusulas pétreas começará logo que o STF retomar suas atividades, no início do próximo ano. Está previsto para fevereiro o julgamento do mandado de segurança de três deputados federais contra a emenda do deputado Amaral Neto (PPR-RJ) que estabelece a pena de morte. Os autores da ação argumentam que a pena de morte não pode ser objeto de emenda constitucional por atingir um dos principais pontos protegidos pelas cláusulas pétreas da Constituição, que é o direito à vida.

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