São Paulo, domingo, 2 de janeiro de 1994
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Biblioteca Nacional quer seduzir leitores

MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO

O Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler) quer acabar com os "happenings" de livros. "Não adianta fazer campanha dizendo que é bom ler, distribuir livros, se não há o hábito de leitura no Brasil", diz a assessora especial e ideóloga do programa, Eliana Yunes. "Essas campanhas são 'happenings', o que só é possível em países que lêem."
Criado há 19 meses por decreto do ex-presidente Collor, o Proler diferencia a promoção da leitura da promoção do livro. "Não adianta dar livro a quem não está acostumado a ler", prega o coordenador do programa, o diretor teatral Francisco Gregório Filho. "A pessoa vai receber o livro e não vai lê-lo."
O Proler é um programa da Biblioteca Nacional, vinculado ao Ministério da Cultura e apoiado pelo Ministério da Educação. Gregório Filho estima em US$ 1 milhão por mês a verba necessária para disseminar o projeto pelo país. Até agora amealhou cerca de US$ 3,6 mil mensais em média, somando o dinheiro distribuído pela Biblioteca Nacional, pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e pelo Fundo Nacional de Cultura.
Para o Proler, é preciso seduzir para conquistar novos leitores. "O Ministério da Educação gasta milhões em livros didáticos, mas não em literatura", ataca Gregório Filho. "É a literatura que é plural, que dá várias visões, que toca o sentimento", acrescenta Yunes.
Os dois colecionam casos de descoberta da literatura. A partir de atividades com "contadores de histórias", em Jequié (BA), uma enfermeira passou a ler no hospital, em casa, a caminho do trabalho. O marido tentou demovê-la: deu-lhe panelas, jogo de travessas e outras utilidades domésticas. No fim, acabou o casamento e hoje a enfermeira conta histórias na rádio local.
No Rio, uma faxineira começou a participar de encontros em que alguém conta uma história literária e de círculos de leitura. Só sabia escrever e ler o próprio nome. Tinha dificuldade de folhear os livros, às vezes os segurava de cabeça para baixo, fingindo ler. Em casa, abria os volumes e os "lia" para os netos, lembrando as histórias que tinha ouvido nos grupos.
O programa chegou a nove estados até agora. Em cursos de sedução literária –chamados de "capacitação de recursos humanos"– participaram aproximadamente 2.700 pessoas. A duração é de dois meses. Nos encontros com autores, círculos de leitura e contadores de histórias, pelo menos 15 mil.
Em dois prédios que somam 1.000 metros quadrados de área útil em Laranjeiras (zona sul do Rio), foi inaugurada em agosto a Casa da Leitura, que sedia o Proler. Lá já estão arquivados em computador mais de dois mil textos sobre leitura. Todo sábado, há atividades para adultos e crianças –cerca de 500 participantes por mês.
Junto com a PUC/RJ, está sendo criado um programa de computador para incentivar a leitura. O leitor escolherá um entre dez autores, uma entre cinco obras suas. Poderá ler, ouvir o texto na voz de um ator, ler o comentário de uma analista e obter outras referências. "A literatura é que seduz novos leitores", insiste Eliana Yunes.

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