São Paulo, domingo, 2 de janeiro de 1994
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Tchecos e eslovacos lamentam o 'divórcio de veludo' há um ano

ADRIAN BRIDGE
DO "THE INDEPENDENT"

Quando as repúblicas Tcheca e Eslovaca comemoravam há um ano a separação, cínicos dos dois lados alertavam que toda essa conversa de um civilizado "divórcio de veludo" da Tcheco-Eslováquia acabaria em lágrimas.
Estavam certos. Mas foi a Eslováquia –a mais fraca e, ironicamente, a que mais insistiu na separação– que derramou a maior parte das lágrimas. "Minha avó até hoje chora pela maneira como nossa república foi destruída", disse Zuzana Betrovska, estudante de música em Bratislava, a capital. "E ela não é a única."
A taxa de desemprego já está em 14% –e continua a subir–, o programa de privatização estagnou-se e quase não há investimento externo. Assim, a liderança eslovaca só pode sentir inveja de sua equivalente tcheca, que dirige uma economia sã e das mais bem-sucedidas do Leste europeu.
Em um grande contraste com a Eslováquia, cuja economia se baseia em obsoletas fábricas de armas e numa antiquada engenharia, os tchecos vivem com uma moeda e um governo estáveis. A taxa de desemprego é de 4% –uma das mais baixas da Europa.
Embora muitos eslovacos quisessem fazer o tempo voltar, quase nenhum acredita que esta seja uma idéia realista. "Muitos de nós gostaríamos de nos unir novamente, mas os tchecos não querem. Eles sabem que estão muito melhor sem nós", disse Betrovska. "Cometemos um grande erro. Agora é tarde demais."
Embora Betrovska diga que ainda tem boas relações com estudantes tchecos na sua faculdade, diz que já pode sentir uma mudança de atitude à medida que as diferenças se tornam mais marcantes e o valor da coroa eslovaca –no início equivalente ao da coroa tcheca– continua a cair. "Há um ano éramos iguais. Agora, nos tornamos uma espécie de cidadãos de segunda classe."
O sentimento de superioridade dos tchecos, pelo menos na esfera econômica, não é surpreendente. Recentemente, a República Tcheca tornou-se o único ex-membro do Pacto de Varsóvia a receber pontos da Moody's, agência internacional que estima o risco de crédito. Em um relatório do banco alemão Deutsche Bank, o país foi descrito como o que tem "o melhor potencial de desenvolvimento de todo o Leste Europeu".
Jan Urban, personagem importante no cenário dissidente da ex-Tcheco-Eslováquia, afirmou: "O primeiro aniversário da separação provocou comparações inevitáveis e nos colocou sob um prisma favorável. No lado tcheco, há um forte sentimento de entusiasmo. Mas há também muitos sentimentos confusos. A maioria dos tchecos não queria a separação. Olhamos o mapa e vemos que ficamos menores. Diante do peso da Alemanha, nos sentimos ainda mais vulneráveis."
Apesar dos aplausos, há o medo de que a República Tcheca também venha a passar por dificuldades. Enquanto alguns afirmam que a economia eslovaca chegou ao fundo do poço, o desemprego tcheco poderá dobrar e chegar a 8% este ano, porque as indústrias tchecas deficitárias vão fechar.
"A parte dramática da transição acabou", disse o premiê tcheco, Vaclav Klaus, seguidor da ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher. "A partir de agora, será um trabalho rotineiro."
Os tchecos se preocupam com a alta dos índices de criminalidade, com o vácuo deixado pelo colapso do Pacto de Varsóvia e com sinais de instabilidade na ex-URSS. Gostariam que o Ocidente abrisse mais os mercados aos bens tchecos e que a Otan (aliança militar ocidental) lhes abrisse as portas.
Tradução de Lise Aron

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