São Paulo, domingo, 2 de janeiro de 1994
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Falta alguém para 94

A pesquisa sobre a sucessão presidencial que esta Folha publica hoje revela abundantes sinais de que o eleitorado não está satisfeito com o elenco de possíveis candidatos. Talvez o dado mais expressivo apareça nas três simulações para o segundo turno. Em nenhuma delas o primeiro colocado (no caso, Luiz Inácio Lula da Silva, do PT) consegue a maioria absoluta dos votos.
Lula obteria entre 46% e 49%, conforme o adversário. O segundo turno foi criado justamente para evitar que o presidente seja eleito com uma votação muito abaixo da maioria absoluta. Situação parecida já ocorrera em 1989, uma vez que Fernando Collor foi escolhido por apenas 42% do total do eleitorado. Pode-se inferir que os outros 58% (os que votaram em Lula, em branco, anularam o voto ou se abstiveram) eram hostis ou, no mínimo, indiferentes ao presidente eleito.
Um segundo sinal de que o elenco de candidatos não entusiasma o eleitorado é o fato de que, na pesquisa espontânea, são 68% os que não apontam nome algum. Pode-se supor que essa porcentagem elevadíssima se deva apenas ao fato de que sequer há candidatos formalmente lançados, até por impedimento legal. Mas, se a elite política brasileira, da qual habitualmente saem os candidatos presidenciais, despertasse entusiasmo nos eleitores, é razoável imaginar que uma fatia bem maior do eleitorado já teria o seu candidato "in pectore", mesmo que a candidatura não estivesse ainda formalizada.
Afinal, os presidenciáveis em potencial são arquiconhecidos, políticos de longa presença na vida pública. Seus defeitos e qualidades, em consequência, são também arquiconhecidos. O problema é que, a julgar pela pesquisa, os defeitos superam de longe as qualidades, a ponto de mais de dois terços do eleitorado ainda não ter um nome na cabeça.
Um terceiro elemento que reforça a sensação de que faltam nomes capazes de sensibilizar o público aparece na parte da pesquisa que indaga sobre comparecimento à urna, no caso de o voto não ser obrigatório. A maioria absoluta (56%) responde que não votaria se não fosse obrigada a fazê-lo. Para uma eleição que tem características virtualmente inéditas (é a primeira eleição geral do Brasil urbano), o desinteresse da maioria é eloquente.
O número reforça, alías, a tese de que o voto deveria ser voluntário, posição que esta Folha há muito defende com ênfase. Forçar o eleitor a comparecer às urnas apenas pela ameaça de sanções não parece a melhor maneira de conseguir um voto consciente.
Talvez se explique o pouco entusiasmo dos eleitores pelo fato de que muito se falou e se fala de renovação da política, mas não parecem surgir nomes capazes de simbolizá-la. É um mau sinal para a abertura do ano eleitoral.

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