São Paulo, domingo, 16 de janeiro de 1994
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Desafios da agroindústria paulista

ANTONIO KANDIR

No artigo anterior referi-me ao processo de desconcentração industrial e às suas implicações para o Estado de São Paulo. Em nenhum outro caso, esse processo é tão acentuado quanto na agroindústria.
Não sem razão, portanto, a Secretaria de Planejamento e Gestão realizou estudo recente, coordenado pelo sociólogo Sérgio Fausto e o economista Guilherme Dias e com a participação dos economistas Liz Damiano Pontes Moreira e Nelson Rocha Augusto.
É sabido que, nos anos 60 e parte dos 70, as políticas fiscais e creditícias do governo federal induziram a crescente integração entre o setor industrial e o setor agrícola.
São Paulo foi o centro dinâmico desse processo de modernização da agricultura. A partir do início dos anos 80, porém, São Paulo deixou gradativamente de concentrar todas as vantagens para o desenvolvimento de projetos agroindustriais.
Concorreram para tanto: a) inovações tecnológicas que permitiram o aproveitamento do cerrado para fins de uma agricultura moderna, com ganhos de produtividade física, em especial no caso da soja; b) redução das diferenças de infra-estrutura no âmbito da região Centro-Sul; c) políticas agressivas de incentivo por parte de Estados, em particular de MG e Estados do Centro-Oeste.
A atuação combinada desses fatores tem resultado no deslocamento das indústrias de primeiro processamento para fora do território paulista e, em alguns casos, na consolidação de pólos agroindustriais em outros Estados.
Os exemplos mais notáveis de indústrias de primeiro processamento que têm "migrado" podem ser encontrados nos segmentos da carne bovina, indústrias de processamento de olerícolas (tomate, ervilha, etc) e indústrias de beneficiamento de soja.
No caso da soja, a região Centro-Oeste tem hoje o parque moageiro mais moderno e com menor capacidade ociosa do país. Na esteira da soja, vão indo os investimentos em integrações avícolas, flzendo com que, ao lado de Santa Catarina, os Estados da região Central, incluído o Triângulo Mineiro, afirmem-se como pólos dinâmicos da avicultura brasileira.
Em face desse processo, os desafios de São Paulo são múltiplos: 1) reter os ciclos finais de beneficiamento; 2) encontrar alternativa adequada para as regiões que tendem a ficar com atividades agropecuárias em declínio no Estado; 3) maximizar as possibilidades oferecidas pelos complexos citrícola e sucroalcooleiro; 4) estimular atividades agrícolas intensas em tecnologia, de alto poder de encadeamento com o setor de serviço e condizentes com a estrutura fundiária e características edafo-climáticas do Estado.
Indicar os desafios é bem mais fácil que superá-los. Mas sem identificar os desafios não há como avançar. Por isso vale insistir na necessidade de recuperar o planejamento estratégico no âmbito estadual e sugerir ações prioritárias.
No caso da agroindústria, o futuro de São Paulo depende de uma série de ações, mas três delas são indispensáveis: 1) negociar com outros Estados a alteração do princípio da origem na cobrança do ICMS, de modo a neutralizar as políticas de incentivo feitas à custa das receitas de São Paulo e da competitividade das indústrias aqui instaladas; 2) dar prioridade à melhoria do sistema intermodal de transporte que dá acesso ao porto de Santos e à melhoria da própria infra-estrutura e gestão do porto, visto que o acesso ao mercado internacional, com custos competitivos, é fator-chave nas decisões de localização das empresas; 3) redefinir o papel e a estrutura da Secretaria da Agricultura e estabelecer parceria com o setor privado, para que São Paulo volte a ter a liderança em matéria tecnológica e fitossanitária, essencial na determinação do potencial de crescimento do agribusiness paulista tanto no mercado interno como no mercado externo.

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