São Paulo, sexta-feira, 21 de janeiro de 1994
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O Ministério Público e Fleury

RENATO MARTINS COSTA

Embora acostumado à dialética própria da vida política, não posso me conter diante de noticiário que envolve o governador e o Ministério Público do Estado de São Paulo, instituição da qual ele, como eu, é oriundo e à qual ainda pertencemos.
O passado de Fleury no Ministério Público projetou seu futuro institucional. Na capital, promotor de Júri, arrostou-se em casos complexos, envoltos na teia escura da repressão e do arbítrio, como os episódios Santo Dias e do 42.º DP.
Líder de classe, foi vice-presidente e, por dois mandatos, presidente da Associação Paulista do Ministério Público. A ação civil pública, instrumento dos mais modernos e eficazes na defesa do patrimônio público e na responsabilização dos malversadores de recursos do Estado, surgiu por ação política coordenada pelo governador, como presidente da Confederação Nacional do Ministério Público, que culminou com a edição da Lei n.º 7347.
Quem teve esse perfil e hoje governa o Estado mais importante da Federação não tem personalidade nem tempo para, por exemplo, influir na eleição interna de um órgão colegiado do Ministério Público; ou ainda tentar influenciar na escolha da lista tríplice para procurador-geral da Justiça. Além disso, supor que se pode influir sobre um eleitorado tão esclarecido, que vota secretamente e como quer, é imaginar o irrealizável.
Influir no Ministério Público e interferir no livre exercício do Poder Judiciário: afirmações fáceis e levianas, desmentidas pela realidade de quase três anos de governo sem que se possa apresentar um caso sequer que comprovasse tal conduta.
O governador acabou de sancionar dois Projetos de Lei que concedem reajuste ao Ministério Público, ao Poder Judiciário e ao Tribunal de Contas. Tal ato, cujo impacto econômico diluir-se-á no primeiro trimestre do ano, ao par com o que ocorrerá com todo o funcionalismo público estadual, foi acoimado de cooptar essas instituições. Quanta irresponsabilidade e desconhecimento.
Quisesse Fleury pressionar tais carreiras, vetaria os aumentos. Assim agindo, obrigaria todas elas, mês a mês, a negociar índice de reajuste, oportunidade em que o governante menos escrupuloso barganharia apoio ou rejeições. São Paulo não se presta a isto.
Porém, houvesse acontecido o veto, certamente surgiriam artigos e editoriais condenando o sufoco financeiro ao qual o governo condenara seus órgãos fiscalizadores...

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