São Paulo, sexta-feira, 21 de janeiro de 1994
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Pensar, nem pensar

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Não é a primeira vez que Oscar Niemeyer briga com as autoridades em defesa de sua obra. Volta e meia, cismam de mexer naquilo que ele criou. Em Brasília, até hoje Niemeyer não engoliu aquele mastro que colocaram no final da Esplanada dos Ministérios, quebrando a monumental perspectiva do Eixo central.
Quando fez o Memorial JK, cismaram que ele desejava impor à cidade a foice e o martelo da bandeira soviética. A briga por causa do aeroporto também foi monumental. Há gente que adora ver a obra de Niemeyer, mas não aprecia morar dentro dela. É uma opinião. O que não se pode é desrespeitar o artista –um dos mais importantes e corretos de nosso tempo em escala internacional.
A Riotur insiste agora em acrescentar ao Sambódromo um espaço que mutila a passarela e traz de volta aqueles andaimes de tubos –uma poluição que, além de medonha, sempre faz pensar no risco de uma tragédia. Como é de seu direito e temperamento, Niemeyer bota a boca no trombone e reclama. Ele quis fotografar o atentado que a Riotur está preparando e foi barrado por um segurança. Não sei por que, lembrei a proibição que pesou sobre JK: podia circular em todo o território nacional, menos em Brasília.
A mecanica da Riotur parece com a estratégia do ministro da Fazenda em "equilibrar" as finanças pátrias. A lei é "aumentar", sejam os impostos, sejam as arquibancadas. Botar os neurônios para funcionar a fim de buscar uma alternativa decente, nem pensar. Se o problema da Riotur é ter mais dinheiro, não será difícil encontrar novas fontes de renda geradas pelo show das escolas de samba.
No casamento (já falecido) do príncipe Charles com Lady Di, a prefeitura de Londres obteve lucro espetacular vendendo o acontecimento que se limitou a um cortejo no Mall. E não precisou desfigurar a sóbria dignidade daquele trecho. Aqui no Rio, se o governador (viúvo) Leonel Brizola casar com a Xuxa, a Riotur constroi um Maracanã em cima do já existente para arrecadar mais dinheiro à custa do espetáculo. (Espero que nem o governador nem a Xuxa levem a sério a idéia.)

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