São Paulo, segunda-feira, 24 de janeiro de 1994
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Frankensteins

Entre as graves sequelas da falência do modelo econômico brasileiro está a resistência corporativa à mudança. A muito custo avançou a abertura econômica para afinal se perceber que o desmonte do entulho protecionista nada tinha de catastrófico ou antinacional, muito ao contrário. As muralhas do "reino das estatais", entretanto, têm-se mostrado mais altas e impenetráveis.
É o próprio Estado que reconhece ter perdido o controle sobre uma criatura sua. Tantas vezes e sob tantos pretextos já se reconheceu essa impotência que, afinal, é o caso de perguntar, como nos filmes de Frankenstein, se o melhor desfecho não seria a destruição pura e simples da criatura que se tornou incontrolável.
O governo Itamar não vê assim o problema, apesar de o presidente já ter reconhecido publicamente que a estrutura de custos da Petrobrás é uma "caixa preta". Em vez de quebrar monopólios e acelerar as privatizações, propõe uma modalidade de fiscalização débil, o "contrato de resultados".
Em princípio, a idéia parece simples e de aplicação mais ágil. A estatal compromete-se com resultados que, frustrados, levarão à demissão de seus dirigentes. Na prática, entretanto, o governo abre mão de controlar o processo de gestão das empresas em que é acionista majoritário.
Sem esse controle, é franca ingenuidade esperar resultados diferentes –especialmente se nada é feito para eliminar o corporativismo predominante nessas empresas. Substituem-se os dirigentes e os mesmos entraves corporativos à mudança e à transparência se farão sentir.
Ora, sabe-se que um dos males intrínsecos às empresas estatais é justamente o corporativismo que perpetua a ausência de controles externos, consistentes com a lógica do mercado. Cobrar resultados sem alterar as condições de gestão é o mesmo que exigir de um Frankenstein desengonçado e inconsciente a integridade de um indivíduo normal.

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