São Paulo, sexta-feira, 28 de janeiro de 1994
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O enquadramento dos fundos

LUÍS NASSIF

O enquadramento dos fundos de pensão
A ofensiva deflagrada pelo governo contra os fundos de pensão estatais decorreu de um erro fatal de estratégia da Abrapp (Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Privada). E deve permitir completar o processo de enquadramento e limpeza da área.
Nos últimos anos, os fundos de estatais passaram a ser alvos de duas espécies de distorções. Uma delas, de ordem corporativa, provocou uma quase privatização branca das estatais, com a transferência gradativa de seu patrimônio para os fundos.
Além disso, a ampla dissociação entre contribuições e benefícios e o hábito das patrocinadoras bancarem sistematicamente desequilíbrios atuariais dos fundos, não passou para os beneficiários a noção de risco. Por isso, não cuidaram de fiscalizar o seu dinheiro, permitindo a segunda espécie de distorção, que foram os abusos de toda ordem.
Parte desses abusos foi decorrência de mero amadorismo. Indicavam-se para funções relevantes da fundação funcionários sem nenhuma familiaridade maior com a área, muitos deles mais interessados nas vantagens funcionais decorrentes do cargo. Sem controle por parte dos beneficiários, foram criadas estruturas administrativas pesadas e onerosas.
As operações suspeitasA segunda consequência do descontrole foi a proliferação pura e simples da corrupção. CDBs de 360 dias, compra de ações acima dos preços de mercado, investimentos suspeitos na área imobiliária, ocorreu de tudo.
Este processo chegou ao auge no governo Collor, quando foram desativados mecanismos de regulação e os fundos estatais, em conluio com algumas instituições financeiras, tornaram-se o território preferencial da ação de PC Farias e Zélia Cardoso de Mello.
Com a eclosão da CPI de PC, os fundos ficaram na defensiva. Antes a falta de investigações e a crescente abulia, que parecia tomar conta do governo Itamar, gradativamente passaram a tomar as rédeas nos dentes.
A culpa da corrupção do setor foi atribuída à desativação do Conselho do setor, no governo Collor, sem que, em nenhum momento, a Abrapp, dominada pelos grandes fundos estatais, assumisse a responsabilidade pela auto-regulação do setor.
Paralelamente, a entidade passou a articular politicamente os interesses dos fundos estatais, como se fossem criaturas de vida autônoma, que não dependessem mais do governo nem dos contribuintes. Articulou a tomada de controle da Acesita, tentou se aliar ao governador do Rio, Leonel Brizola, no episódio da compra da CSN e, ultimamente, tratou de articular a participação acionária em um diário econômico –dentro da estratégia de conquistar independência política.
Puxão de orelha
Chegou ao ponto máximo com uma carta aberta ao presidente da República e o anúncio de que entraria na Justiça contra a decisão do ministro da Fazenda, de obrigar os fundos de estatais a adquirem Notas do Tesouro Nacional.
A reação do governo foi fulminante. Num primeiro contato com o Ministério do Planejamento, receberam um duro chamamento do secretário geral, Raul Jungmann. Este lembrou que, em nenhum momento, os fundos trataram de ganhar legitimidade, investindo no aprimoramento do setor público, buscando setores produtivos para investir, cuidando de melhorar a imagem. Numa segunda reunião, com o próprio ministro Alexis Stepanenko, o puxão de orelhas foi reiterado.
Finalmente, tiveram uma última reunião com o ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. Quando informado que a Abrapp entraria na Justiça contra o governo, o ministro deu a sentença definitiva. Informou que os fundos de estatais deviam obediência ao governo e quem se recusasse a cumprir o estabelecido seria demitido.
A partir daí, estava decretada a temporada de enquadramento dos fundos estatais. Espera-se que, com ele, esteja encerrada a temporada de impunidade, através do levantamento do enorme passivo de infrações praticado na era Collor.
Ajuste público
O CrediReal de Minas Gerais tornou-se o primeiro banco estatal a proceder a um amplo ajuste interno. Reduziu em um terço as agências e em 36% o número de funcionários. Um ano depois, seus depósitos à vista são US$ 65 milhões maiores do que no início do processo.

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