São Paulo, domingo, 2 de outubro de 1994
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Dimensão equivocada

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Não é minha intenção responder às ofensas de Sebastião Milaré, domingo passado neste caderno, em réplica à resenha que escrevi sobre seu livro, "Antunes Filho e a Dimensão Utópica".
Foram coisas como "ele não sabe ler", "baboseiras", "crítico" entre aspas, "cabecinha", "tolice", "cego", grosserias de todo gênero, que falam por si mesmas.
Contudo, foram feitas outras afirmações às quais cabe resposta, antes que se estabeleça como palavra final aquilo que não passa de violência retórica. Pela ordem:
1. O autor responde com ofensas à opinião, contida na resenha, de que o livro dedica-se a provar que "Vereda da Salvação" é uma montagem de importância maior do que "Macunaíma".
A opinião baseia-se no próprio livro. Por exemplo, quando diz que "as pesquisas, os laboratórios, as prospecções cênicas, as relações internas do grupo, tudo derivava das experiências anteriores".
Se "tudo" vinha de "Vereda" e das montagens que a seguiram, "Macunaíma" não passa de um espetáculo "derivado".
Não é o que pensa o próprio Antunes Filho, que declarou ter "vergonha" de tudo o que dirigiu, antes de "Macunaíma".
Em seu livro, Sebastião Milaré tenta desdizer Antunes, escrevendo que o diretor falava de uma "vergonha hiperbólica".
2. O autor diz que a resenha não percebe que, na apresentação de seu livro, está registrado que "Macunaíma" foi deixada "para um futuro trabalho, onde importarão os métodos etc."
A resenha não só percebe, como refere-se à apresentação, afirmando que a desproporção entre a atenção dada a "Macunaíma" e "Vereda" ainda "poderia ser corrigida em edição futura".
O que não poderá ser corrigido, concluiu a resenha, em seguida, é a tese central do livro, de que "Macunaíma" foi uma mera consequência do que o diretor havia feito antes, em "Vereda".
3. Depois de dizer que "Nelson de Sá não leu o livro com a devida atenção ou simplesmente não sabe ler", o autor pergunta-se: "Não sei em que ponto do livro ele conseguiu encontrar uma comparação de Antunes com Judith Malina."
A comparação está na pág. 136, linhas 10 a 13: "Antunes Filho, no processo de montagem de `Vereda da Salvação', e também de `A Falecida', apresentou vários `paralelos e pontos de contato' com o trabalho (...) de Beck e Malina."
4. O autor evita lembrar as frases de seu livro sobre Antunes Filho ("vê-lo dirigir é algo maravilhoso" etc.) enquanto dá a entender que a resenha visou elogiar Zé Celso contra Antunes.
Cita que o resenhista "foi colaborador de Zé Celso em `As Boas' e `Ham-let'," sem procurar argumento, mas buscando a insinuação maldosa. Segue a regra de uma crítica viciada nos camarins.
Uma crítica para a qual tenta atrair o resenhista. Que se informe, contra os vícios de classe, que o trabalho com o diretor terminou antes da estréia de "Ham-let", em divergência de opinião.
O que não quer dizer que o resenhista não guarde orgulho de ter sido assistente de Zé Celso, que foi assistente de Augusto Boal, que foi assistente de Antunes, que foi assistente de Ziembinski.
Sem que houvesse maior concordância, entre todos.
5. Por fim, o autor não toca num trecho da resenha que é preciso lembrar, pois é o que explica, a meu ver, a violência da réplica. "(O livro) edita a crítica de Décio de Almeida Prado escrita na época, sobre `Vereda da Salvação', evitando trechos negativos."

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