São Paulo, segunda-feira, 17 de outubro de 1994
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Diretor armênio se define pelo silêncio

IRINEU FRANCO PERPÉTUO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Artavazd Pelechian não usa palavras em seus filmes. Fora do cinema, também é um homem de poucas palavras. Esse gosto pelo silêncio, pelo que não se diz em palavras, é a particularidade de seu trabalho, que já influenciou o diretor norte-americano Godfrey Reggio (de ``Koyaaniskatsi").
As influências que provocou é um dos assuntos que ele se recusa a comentar, assim como política. O fato é que, junto com diretores como Askharian (apresentado ao Brasil na Mostra de 1993), sua lírica representa a ascensão do cinema armênio no cenário mundial.
Às vésperas de sua chegada ao Brasil para acompanhar uma retrospectiva de seus trabalhos na 18ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, Pelechian concedeu a seguinte entrevista à Folha, por telefone, de Moscou.

Folha - Quando o sr. começou sua carreira ?
Artavazd Pelechian - Em 1963, entrei no Instituto de Cinema de Moscou. Ali encontrei ótimas pessoas, que me ajudaram.
Folha - O sr. não é apenas cineasta, mas também professor.
Pelechian - Eu já lecionei direção em Moscou, era um trabalho de que eu gostava muito, mas parei, porque com o tempo começou a acontecer um acúmulo de ocupações, já não era mais possível.
Folha - O sr. começou sua carreira há 30 anos. Como era o cinema naquela época?
Pelechian - O cinema era muito bom. Você vai perguntar se havia censura. A resposta é não.
Folha - A música tem um papel importante em seus filmes. Na sua opinião, qual a relação entre cinema e música ?
Pelechian - Eu não faço relação entre música e cinema. Eu relaciono o sentimento da música e o sentimento da imagem. Ou seja, não monto sons e imagens, mas o sentimento expresso em imagens e o sentimento expresso em sons.
Folha - Por que o sr. não emprega palavras em seus filmes?
Pelechian - Pode-se dizer muito sem palavras. A música toma o lugar das palavras em meus filmes.
Folha - No Ocidente, o sr. é classificado como minimalista, porque seus filmes repetem certas imagens. Qual o motivo dessa repetição?
Pelechian - Isso não é repetição.
Folha - O que é isso?
Pelechian - É um método de imagens.
Folha - Como é esse método?
Pelechian - Uma resposta a esta pergunta seria muito longa. Seria preciso transcrever um artigo que escrevi sobre o assunto. Só posso dizer que isso não é montagem.
Folha - Não há uma definição rápida?
Pelechian - Não. A resposta rápida é: isto não é repetição.
Folha - Nem minimalismo?
Pelechian - Não.
Folha - Seus filmes não são narrativos. O sr. constrói uma estética abstrata?
Pelechian - Não. Meus filmes são cinematográficos.
Folha - Seus filmes ``Nós" e ``As Estações" mostram imagens da Armênia. O sr. acredita em uma estética nacional?
Pelechian - Não. Eu emprego um invólucro nacional, mas não imagens, não neste sentido. O cinema é internacional. Veja bem, não a minha estética, mas a do cinema.
Folha - Existe uma estética de Pelechian ou a estética de Pelechian é a estética do cinema?
Pelechian - Não. O que existe é uma montagem de Pelechian.
Folha - Como ela é?
Pelechian - Distancial. Não peça para explicar melhor.
Folha - É indiferente para o sr. trabalhar ou não sob o comunismo?
Pelechian - Não falo de política.
Folha - Por que o sr. só faz curtas ?
Pelechian - O mais importante não é a metragem.
Folha - O sr. pretende fazer um longa intitulado ``Homo Sapiens". Como será?.
Pelechian - Não sei ainda. A idéia existe, porque o roteiro já está pronto. Mas é impossível dizer o que há roteiro. É preciso primeiro filmar e ver como fica na tela.
Folha - O que o sr. acha do cinema russo contemporâneo?
Pelechian - É bom. Há muitos filmes interessantes. Gosto muito de Nikita Mikhalkov, Elem Klimov e Andrei Konchalovski.
Folha - O sr. conhece os filmes ``Koyanisqaatsi" e ``Powaqaatsi", do diretor norte-americano Godfrey Reggio?
Pelechian - Sim, e gosto.
Folha - O sr. acredita ter influenciado estes filmes ?
Pelechian - Eu não falo nessas coisas.
Folha - O sr. se sente influenciado por Dziga Vertov ?
Pelechian - É um gigante, influenciou não apenas a mim, como a vários outros. Aquilo era cinema.

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