São Paulo, quinta-feira, 20 de outubro de 1994
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Waltércio Caldas expõe obras recentes no Gabinete de Arte

BERNARDO CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Waltércio Caldas costuma contar uma piada de português para definir seu trabalho, um dos mais inteligentes e perspicazes da arte brasileira: ``Sabe o que o português disse quando viu uma girafa pela primeira vez? `Ora, este animal não existe!"'
As sete esculturas do artista, expostas a partir de hoje no Gabinete de Arte, dão uma impressão análoga. Há sempre um pequeno detalhe, uma dissimetria quase imperceptível em meio à aparente simetria absoluta, que provoca uma espécie de tontura, de estranhamento, como se o mundo, por um instante, tivesse saído do lugar sem que tenha havido testemunhas dessa perturbação silenciosa.
São duas peças de vidro, duas de aço inox e três de madeira. ``Cada uma tem uma questão que começa e acaba nela. Há três tipos de espaço: dentro delas, na pele delas e entre elas. A exposição é a vibração entre esses espaços. Todos os pontos de cada peça estão tensos. Mas o todo é repousado. Há a convivência da tensão física com uma espécie de repouso dinâmico", diz o artista.
Caldas surgiu dentro da tradição da arte conceitual, mas acha que hoje o termo perdeu muito de seu sentido. ``A arte conceitual surgiu em um momento para restaurar o pensamento dentro da arte. Foi uma hora importante. Hoje, arte conceitual é um rótulo preguiçoso, que classifica desinformando. Meu trabalho tem um componente conceitual, mas também construtivo, minimal, pop etc. Hoje o termo arte conceitual atende ao que você não sabe o que é", diz.
Assim como o rótulo ``arte conceitual", Caldas também acredita que o termo instalação tenha perdido seu sentido original e mais forte com a onda de instalações que assola o mundo das artes, como pode ser visto na atual Bienal.
``É muito difícil achar um artista de instalação hoje. Não é mais a crítica e o pensamento do espaço que norteiam o trabalho, mas a adaptação ao espaço, o que faz a coisa bem diferente", diz.
Esse pensamento é o que não falta aos trabalhos de Caldas. Nas esculturas, ``o pensamento é um instrumento" e a dimensão conceitual e reflexiva vem dessas pequenas dissimetrias que desequilibram todas as ordens –do espaço, do espectador– quando tudo parecia tão calmo e ordenado. Criam um espanto, dando ao espectador a impressão de que alguma coisa está fora do lugar sem que ele saiba exatamente o quê.
Peças que são tão mais estranhas por sua aparente normalidade. ``Todas estas peças são lineares, mas na realidade são faces. Você vê o volume pelo lado, pelas partes que o compõem. É como se as peças quisessem entrar no ar pelos lados", diz.

Exposição: Waltércio Caldas
Onde: Gabinete de Arte (r. Artur de Azevedo, 401, Pinheiros, zona oeste, tel. 883-6322)
Quando: A partir de hoje, às 19h; até 26 de novembro (de segunda a sexta, das 10h às 19h; sábado das 11h às 14h)

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