São Paulo, sexta-feira, 21 de outubro de 1994
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Jornalismo aético

JOSÉ ROBERTO BATOCHIO

``Fazer-vos a vontade? Ceder? Jamais! Jamais! Quem sois? A Fatuidade? Eu bem sei que sucumbo e não vos mato... Não faz mal, eu me bato, eu me bato, eu me bato? (Edmond Rostand, ``Cirano de Bergerac")

Todos assistiram, estarrecidos, até onde os interesses escusos, a intolerância com as idéias opostas e o ódio pessoal podem arrastar a comunicação social, mesmo no seio de um jornal democrático como a Folha.
O empresário-colunista Luís Nassif –conhecido pelos ataques a personalidades públicas que elege, de tempos em tempos, como alvo– declarou a sua ``jihad" (guerra santa) à Ordem dos Advogados do Brasil, na pessoa de seu presidente nacional, que a representa.
Desnecessário dizer que o proprietário da agência ``Dinheiro Vivo" (que vende serviços ao setor financeiro e ao empresariado) tem objetivos bem definidos nessa campanha difamatória, em que se desceu ao último degrau da ética jornalística: desgastar a OAB e seu presidente perante a opinião pública para que certos interesses econômicos não possam ser vigorosamente repelidos, quando pretenderem, novamente, assenhorear-se do patrimônio público (vem aí o segundo ``round" dessa tentativa, com muito dinheiro e com muito vivo!).
Assim, Nassif deflagrou sórdida campanha difamatória, na qual se buscou demolir a imagem pública e a honra pessoal de quem teve a suprema audácia de não se alinhar ao seu pensamento.
Por aquilo que encarna e representa em si mesmo, não mereceria ele resposta outra senão a que terá na esfera adequada. Há, porém, a indeclinável necessidade de se restabelecer a verdade, em defesa da honra ultrajada perante a opinião pública. O presente repúdio poderá servir, também, de estímulo a tantos outros igualmente agredidos.
Em outubro de 1968, quando eclodiu a ``guerra" da rua Maria Antonia, entre estudantes da Universidade de São Paulo e do Mackenzie, momento em que teria surgido o denominado Comando de Caça aos Comunistas, eu ali não poderia estar eis que, formado em 1967, deixara a Faculdade de Direito fazia um ano. Erro de cronologia.
Essa história de ``simpatizante" daquele grupo já foi exaustivamente esclarecida nas campanhas eleitorais da OAB. Insinuações rasteiras e injustas como essas também já foram feitas contra o grande jornalista, que honrou essa casa, Boris Casoy. Tudo falso!
Se o atual prefeito Paulo Maluf e o jornalista Ferreira Netto ``saudaram" a minha eleição, em 1990, para a presidência da OAB/SP, não sabia disso. Resta-me agradecer a saudação, mesmo porque diferenças de idéias não pressupõem a supressão da cortesia às pessoas que pensam diversamente. Se a alusão quis insinuar engajamento político-partidário, deixo patente que jamais me filiei a qualquer partido político.
Desconhece o colunista que há um compromisso tácito entre os que ascendem à presidência nacional da OAB de não aceitarem cargos públicos nos governos. A história de Ministério da Justiça veiculada não faz qualquer sentido.
Como contratado da Associação dos Delegados de São Paulo e juntamente com notável criminalista e professor da PUC/SP, copatrocinei a defesa do falecido delegado Jacir Damiani, acusado de envolvimento com certo delinquente. Sua própria entidade de classe o entendeu merecedor de defesa digna, qualquer que fosse a gravidade da acusação. Nassif crê que há seres humanos que não merecem qualquer tipo de defesa?
Rigorosamente falso que tenha eu dito ao jornal ``O Estado de S. Paulo" que, se secretário da Segurança fosse, arquivaria o investigatório (decisão de competência do Judiciário, aliás) e reintegraria o servidor em seu cargo. Soa ridícula essa afirmação.
Inveraz, por igual, a alusão ao retorno do ministro Paulo Brossard à advocacia, sobre o qual nunca me manifestei ``aos jornais", como consta daquela repulsiva matéria prontamente desmentida em nota oficial da OAB.
Quanto à minha banca de advocacia criminal –cuja atividade, por óbvio, cifra-se na defesa de pessoas acusadas da prática de delitos–, escuso-me de elencar os jornalistas, magistrados, políticos, comerciantes, homens do povo, operários, funcionários, e outros, que por ali passaram. Não advoguei ``quase que exclusivamente" para ninguém, muito menos para pessoas envolvidas com comércio de estupefacientes.
Nem sequer um único caso de acusação de jogo do bicho patrocinei em juízo em favor de quem quer que seja, sendo certo, porém, que, para o julgamento de três casos de júri, exclusivamente, a minha banca foi contratada, como é público, para promover, nesses casos, a defesa do cidadão que foi nominado na infamante matéria.
Reduzi, como presidente da OAB/SP, as anuidades dos advogados paulistas em cerca de 45%, equipei todas as subsecções do interior com aparelhos de fax, bibliotecas, máquinas copiadoras, telefones, máquinas datilográficas etc., não para obter votos, porque presidente já era, mas para permitir, em benefício dos advogados e da comunidade, serviços advocatícios mais eficientes.
Mais ainda, adquiri a sede própria da Caixa de Assistência dos Advogados e fiz instalar dezenas de gabinetes odontológicos para assistência dos profissionais congregados, assim como instituí o seguro-saúde para a classe, este com a seguradora que já fora credenciada pelos meus antecessores e opositores na direção da OAB/SP. Instituí, igualmente, reposição salarial mensal para o quadro funcional da entidade (1991).
Apesar de tudo (e da redução de quase 50% do valor das anuidades), ao término da gestão, ficaram em caixa, como superávit, não os US$ 300 mil que ali encontrei, mas US$ 4 milhões.
A impressão do jornal de campanha de meu sucessor na presidência da OAB/SP, João Roberto Egydio Piza Fontes, na Imesp, nada tem a ver com a seccional paulista, mas foi custeada por ele e seus companheiros de chapa, conforme declaração e recibo firmados por aquela empresa gráfica.
A eleição para a presidência do conselho federal da entidade, como se vê, não se deveu à reunião de todos os presidentes estaduais em Natal, às expensas da OAB/SP, que já não mais era por mim presidida quando do evento.
Aliás, quando isso se alegou, o assunto foi esclarecido, com os comprovantes de despesas rateadas entre seccionais da OAB, inclusive os depósitos bancários, documentação esta encaminhada ao digno sr. Otavio Frias Filho (fato que Nassif não ignora).
Essas inverdades tinham de ser desnudadas publicamente e o quanto aqui ficou esclarecido comprova-se documentalmente a quem possa interessar.
Faz pensar ao leitor o que teria levado um colunista econômico a se dedicar, em várias edições deste jornal, a promover a empreitada demolidora contra o advogado. Qual seria a razão? Que interesses se ocultam sob esse incompreensível e condenável resvalo, inclusive ético? A conclusão fica para cada qual.
Este é o direito de resposta que, por se tratar da Folha, não há necessidade de ser buscado no Judiciário, mas é alcançado pela solicitação que se faz à democrática direção do prestigioso órgão de comunicação social.
A sua publicação não reparará os enormes danos infligidos à imagem e à honra. Serão eles recompostos, no resíduo irresgatável, na esfera própria, incansavelmente.

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