São Paulo, sábado, 22 de outubro de 1994
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Militares não querem subir morros

SILVANA DE FREITAS ; RUI NOGUEIRA ; FABIO GUIBU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As Forças Armadas estão prontas para intervir no combate à violência no Rio. Em reuniões fechadas, os comandos do Exército, Aeronáutica e Marinha na cidade já traçam um plano comum de ação. Mas eles trabalham para evitar que tenham de subir os morros.
O ministro da Marinha, Ivan Serpa, afirmou ontem que o emprego das tropas nesta operação terá de ser intensivo para dar resultado. Ele culpou ontem a ``ineficácia da ação policial" pelo aumento da criminalidade no Rio.
Segundo Ivan Serpa, os fuzileiros navais do Rio estão preparados para participar de uma operação a ser comandada pelo Exército. ``Temos condições de combater um oponente armado."
O ministro disse não haver ``a menor possibilidade" de evitar mortes, se os militares subirem os morros para combater o crime. ``Não há nenhum exagero em prever que num combate sério ao crime haverá baixas."
Ele disse que a autoridade à qual a polícia é subordinada tem responsabilidade pelo aumento da violência, numa referência ao ex-governador Leonel Brizola e ao governador Nilo Batista.
Ivan Serpa disse ter motivos pessoais para estar ``absolutamente preocupado" com a criminalidade no Rio: a partir de janeiro vai morar em Ipanema e os seus filhos e netos já moram na cidade.
Na segunda-feira, o ministro da Justiça, Alexandre Dupeyrat, passa todo o dia reunido com os comandos das três Forças no Rio para traçar as estratégias. Na terça, ele espera conversar com as autoridades da área civil.
O presidente Itamar Franco receberá na quarta-feira o relato do ministro Dupeyrat. A decisão sobre as ações caberá a Itamar.
O ministro Henrique Hargreaves (Casa Civil) disse que Itamar vai seguir as normas legais e constitucionais para autorizar a operação.
Dupeyrat adiantou que o governo tomará medidas de longo prazo. ``Se não, o crime organizado e a criminalidade em geral tendem a se expandir." Ele descartou uma intervenção militar que fira a autonomia do governo estadual.
O diretor-geral da PF, coronel Wilson Romão, disse ontem em Recife desconhecer solicitação feita por Dupeyrat para que a PF atue em conjunto com as Forças Armadas contra o crime organizado no Rio. Ele confirmou, porém, que a corporação já tem pronto um plano de ação nos morros cariocas.
Seriam utilizados, segundo o coronel, ``de 2.000 a 3.000 homens" do Exército e das polícias Federal e Militar e Civil no cerco aos morros. ``É um plano simples, cercamos a área, vasculhamos e tiramos os bandidos", afirmou. ``Se reagir, será retribuído à altura."
Segundo Ivan Serpa, uma operação militar de combate ao crime precisará estar acompanhada de uma ``ação constante" da polícia.
O ministro disse que o esquema montado pelo Exército na conferência Rio-92 criou ``um hiato" na criminalidade. ``Para que melhore definitivamente, a polícia tem de ter uma ação constante."
A Folha apurou que apesar de se dizer preparada para subir o morro, a cúpula das Forças Armadas trabalha para evitar que isso aconteça. Os chefes das Forças Armadas temem as consequências e preferem o que eles chamam de ``estilo Eco/92": ficar à porta do morro, tomar o asfalto e virar o canhão para a favela. No morro sobem a PM e a PF.
Os militares não querem subir por dois motivos. Motivo técnico: militar é treinado para matar, destruir, arrasar e tomar uma posição e leva tempo para saber se movimentar de forma defensiva entre barracos e no meio dos civis.
Motivo político: eles temem que ao primeiro fogo cruzado, matem algum civil e sejam comparados à PM. Um general disse ontem à Folha, que, nesse momento, ninguém lembrará que a morte foi acidental ou em legítima defesa.
O Exército avisou ao Ministério da Justiça e ao governo estadual que só entrará de forma mais ostensiva no combate à violência sob ordem expressa do presidente.
(Silvana de Freitas e Rui Nogueira)
Colaborou FABIO GUIBU, da Agência Folha.

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