São Paulo, quarta-feira, 26 de outubro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Selo comemorativo

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Algum leitor consegue imaginar quantos selos foram gastos pelo Congresso no mês de setembro, véspera das eleições, distribuídos para 81 senadores e 503 deputados?
Só acreditei na resposta porque me foi fornecida oficialmente ontem pela direção dos Correios: cerca de 2 milhões de selos. Divida-se por 584 parlamentares. Temos, então, uma média de aproximadamente 3.424 selos para cada um. Apenas em um mês. É curiosíssima a evolução das compras.
Em julho, a Câmara adquiriu 368 mil selos e, só pode ser coincidência, em agosto, quando se aproximavam as eleições, pulou para 1 milhão.
O Senado, em julho, comprou 307 mil e, mês seguinte, pulou para 804 mil. Ou seja, os 81 senadores tiveram o mesmo consumo, nesse mês, do que todos os 503 deputados.
Essa profusão serve, agora, não apenas para suspeitas de uso eleitoral de dinheiro público. A Polícia Federal deve entregar nos próximos dias aos Correios resultado da investigação sobre funcionários do Congresso supostamente envolvidos no contrabando de selos. Fácil entender.
Os parlamentares recebem uma cota gratuita de selos, adquiridos pelo Congresso. Descobriu-se, porém, uma derrama no mercado de Brasília, drenada por agências franqueadas (administrada por particulares) dos Correios. Essas agências compravam o produto com deságio e vendiam ao consumidor pelo preço tabelado.
À primeira pista ocorreu porque uma das franqueadas exibia um bom faturamento –mas, curiosamente, não comprava selos dos Correios. Uma equipe de fiscal constatou que apenas uma agência comprou cerca de R$ 50 mil de um funcionário do Congresso –a instalação foi fechada.
A partir daí a direção dos Correios enviou relatório para as presidências da Câmara e do Senado, informando do desvio de selos –e, ali, deveriam ser realizadas auditorias internas. Ao mesmo tempo, acionou-se a Polícia Federal para tentar investigar a extensão e as conexões em Brasília do comércio clandestino.
Esse é um autêntico selo comemorativo –comemorativo, diga-se, da bandalheira.

Texto Anterior: O mistério da droga
Próximo Texto: RETÓRICA (1); RETÓRICA (2); PREGRAMA, ORA PROGRAMA
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.