São Paulo, quinta-feira, 27 de outubro de 1994
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Ford salva o faroeste com `Diligências'

ESPECIAL PARA A FOLHA

``No Tempo das Diligências", o clássico faroeste de John Ford, de 1939, é um ``grande filme" e também um dos filmes mais divertidos do cinema.
Tem um pouco de quase tudo que se exige do gênero: a diligência, os índios, a cavalaria, uma genial sequência de perseguição, o ``saloon", o tiroteio final na rua vazia e um naipe de personagens com que você logo se identifica.
Esses personagens são o pistoleiro infalível (John Wayne), a puta de bom coração (Claire Trevor), a mocinha careta (Louise Platt), o médico bêbado (Thomas Mitchell), o banqueiro corrupto (Berton Churchill), o trapaceiro elegante (John Carradine), o xerife durão (George Bancroft), o cocheiro bobalhão (Andy Devine). E todos, à sua maneira, têm um lado nobre e heróico.
Todos, aliás, se tornaram tipos emblemáticos do faroeste –e os atores que os fizeram neste filme deram-lhe os rostos que esses tipos teriam daí em diante.
Mas ``No Tempo das Diligências" fez mais: salvou da extinção um gênero que, em 1939, já era dado como morto. Os únicos faroestes que então ainda se produziam eram aqueles ``classe Z", para platéias infantis da roça.
Ford bateu à porta de vários estúdios para tentar rodá-lo. Ninguém queria saber: faroestes estavam ``out" desde 1930. Walter Wanger, produtor independente, topou produzi-lo e, desde então, ``No Tempo das Diligências" foi tão copiado que suas inovações temáticas podem hoje parecer clichês.
Mas, 55 anos depois, continua insuperável pela beleza dos ``takes" naturalistas de Ford. A câmara parece estar sempre no único lugar em que deveria estar. Cada composição é um quadro, e o filme inteiro é uma aula de angulação.
Em todas as cenas de interiores, pode-se ver o teto (alto que não se usava então). Não admira que orson Welles –que, daí a dois anos, abusaria do teto em ``Cidadão Kane"– tenha projetado ``No Tempo das Diligências" 28 vezes em um mês, pouco antes de rodar ``Kane". E sempre na companhia de um técnico para perguntar-lhe: ``Como Ford fez isso? Como Ford fez aquilo?"
A Continental Home Vídeo, tão generosa em lançar os clássicos no Brasil, poderia caprichar mais no acabamento. A fabulosa fotografia de Bert Glennon, cheia de nuances no preto-e-branco original, foi reduzida ao cinza. O som tem um chiado de disco em 78 rpm. E, pior do que tudo, as legendas parecem ter sido traduzidas de ouvido: o tradutor raramente acerta o nome dos personagens, omite boa parte dos diálogos e erra em outros. (Ruy Castro)

Vídeo: No Tempo das Diligências (Stagecoach)
Direção: John Ford
Elenco: John Wayne, Claire Trevor, Thomas Mitchell, John Carradine, George Bancroft, Louise Platt, Berton Churchill
Produção: EUA, 1939, preto-e-branco
Distribuição: Continental Home Video

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