São Paulo, domingo, 30 de outubro de 1994
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Pacote corta lucros dos bancos no crédito direto ao consumidor

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

A situação dos bancos em geral, e dos estatais em particular, tende a ficar bastante apertada após o pacote de arrocho ao crédito baixado pelo governo.
Esse pacote restringe fortemente a concessão de empréstimos, especialmente crédito direto ao consumidor, operação muito rentável, que os bancos estavam incentivando para compensar a perda dos ganhos inflacionários.
No ano passado, os 40 maiores bancos brasileiros tiveram receita líquida de US$ 35 bilhões. Nada menos que US$ 9,1 bilhões (26%) foram receita inflacionária.
Essa receita era obtida com aplicação de dinheiro que ficava parado em conta ou transitava nos bancos por um ou dois dias.
Os bancos não remuneravam esse dinheiro e o aplicavam a taxas de 45% ao mês. O que dava um lucro inflacionário bastante alto.
Com inflação perto de zero, os bancos tinham de cobrir esse buraco com elevação das operações de crédito, cobrança de serviços e redução de despesas.
Com o aquecimento do consumo logo após o Plano Real, o crédito ao consumidor cresceu e tornou-se o mais rentável. Os bancos começaram a voltar suas baterias para esse segmento de mercado.
Lucro extra
As taxas de juros, nessa modalidade de crédito, chegavam a 8% ao mês, ou 151% ao ano. Era como se o consumidor, ao comprar um televisor em 12 meses, pagasse 2,5 aparelhos para levar um.
Esse 1,5 extra era lucro financeiro, dividido entre a loja e os bancos, que ficavam com a maior parte, na condição de fonte primária de financiamento.
Em julho deste ano, primeiro mês do real, os bancos ainda fizeram muito dinheiro. Foi, entretanto, um período atípico. Os bancos apanharam um resto de inflação, junto com as novas operações de crédito.
Raros bancos revelaram os balancetes de agosto e setembro, mas estava claro que todos os bancos tratavam de reforçar suas operações de crédito, com absoluta prioridade.
Isso porque os bancos privados, na maioria, já tinham reduzido suas estruturas e quadros de pessoal. E os bancos estatais simplesmente não conseguem, por restrição legal e política, reduzir pessoal.
E para todos os bancos, o ganho com prestação de serviço será sempre limitado. Restava, portanto, o ganho com crédito, agora limitado.
O Banco do Brasil, por exemplo, obteve receita de US$ 8,6 bilhões no ano passado. O ganho inflacionário foi de US$ 1,6 bilhão (19,1% da receita total).
Segundo estudos de Carlos Coradi, da EFC - Engenheiros Financeiros & Consultores, supondo que receita inflacionária caísse para US$ 411 milhões (pouco menos de 5% do total), o BB precisaria aumentar em 130% seu ganho com operações de crédito e prestação de serviços, para obter o mesmo lucro.
Recursos próprios
Ainda no ano passado, o BB gastou US$ 4,9 bilhões com pessoal, o que representou a metade da despesa total. É um gasto impossível de ser reduzido.
Por outro lado, os bancos brasileiros em geral têm poucos recursos próprios disponíveis para empréstimos.
Ainda segundo dados da EFC, os bancos brasileiros tinham, no ano passado, 88% de seu patrimônio líquido em ativos imobilizados (principalmente prédios, equipamentos e ações de empresas controladas ou coligadas).
Sobravam, portanto, apenas 13% de recursos próprios para o giro. Na Argentina, os bancos têm, em média, 73% de recursos próprios aplicados em empréstimos.
Os empréstimos com recursos próprios são mais lucrativos.

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