São Paulo, domingo, 30 de outubro de 1994
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Aritmética, exportação e emprego

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

O Brasil começa a reconquistar uma boa imagem na comunidade internacional. O ``New York Times" do último dia 20 dedica uma grande reportagem enaltecendo o fato de o nosso país estar saindo da longa crise econômica em que se meteu desde a década de 80, com muita garra e bastante criatividade.
O artigo destaca a alta qualidade das nossas exportações. Não se trata de mera ``badalação", pois aquele jornal não é dado a essas coisas. Ao contrário, a reportagem está fundamentada em fatos concretos. As empresas brasileiras fizeram um grande esforço de modernização tecnológica e administrativa nos últimos anos. Mais de 400 firmas do Brasil já possuem o certificado de qualidade internacional (ISO 9000). No México, são apenas 133; na Colômbia, 25; na Venezuela, 22; e no Chile, cinco. Nesse campo, o Brasil já ultrapassou até mesmo alguns Tigres Asiáticos como é o caso da Coréia que tem 200 firmas credenciadas e a própria Índia que tem um número semelhante.
No momento em que o nosso país recebe essa distinta consideração, as nossas autoridades decidiram jogar um balde de água fria nas exportações brasileiras. As recentes medidas no campo do câmbio foram oportunas mas, indubitavelmente, mal orientadas.
Já era tempo de se acabar com a malandragem de muitas empresas que vinham fazendo operações de câmbio sem ter o que exportar, beneficiando-se de um jogo especulativo em torno das duas moedas. Mas, a criação dos 15% de compulsório combinada com o encurtamento do prazo dos ACCs inverteram inteiramente a situação anterior. Antes, os mal-intencionados lucravam com o câmbio sem ter o que exportar; hoje, os bem-intencionados têm o que exportar, mas não dispõem de regras razoáveis. Senão vejamos.
Trinta dias de prazo para alguns e compulsório para todos criam uma situação insustentável. Pode ser que para exportar flores, por avião, esse prazo seja mais do que suficiente. Mas, para exportar commodities, de navio, através de portos superburocratizados como os nossos, a missão é impossível. Para esses exportadores, puxaram-lhes o pau da barraca.
O compulsório de 15% nas operações de ACC travou o câmbio. Só no primeiro dia, as exportações caíram de um patamar de US$ 200 milhões para US$ 25 milhões. Nas novas condições, o exportador desiste de exportar ao perceber que vai receber apenas US$ 725 para cada US$ 1.000 exportados.
Sim, porque os 15% do compulsório são aplicados a um câmbio que já está defasado em 15%. É uma mera questão de aritmética.
Para acabar com a jogatina, o governo remeteu os exportadores sérios para o inferno. Tudo isso acontece no momento em que, lá fora, a imprensa elogia o esforço das empresas brasileiras ao superarem as mais violentas turbulências e se colocarem com exportadoras de boa qualidade. É irônico.
Mas, ainda há tempo para se corrigir o deslise. Afinal, todos sabem que, caindo a exportação, cai o emprego. E caindo o emprego, cai o mínimo de ordem que ainda resta nesta nação. Ninguém pretende generalizar para o país o caos que tomou conta do Rio de Janeiro. Estas críticas visam construir pois continuo acreditando no Brasil.

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