São Paulo, quinta-feira, 3 de novembro de 1994
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Votar contra Rossi

JOSÉ DIRCEU

O PT realizou um encontro extraordinário em que decidiu votar contra Francisco Rossi no 2º turno em São Paulo, a favor de Mário Covas.
Escrevo para expor os motivos da decisão e agradecer de coração aos mais de 2 milhões de cidadãos que votaram no 1º turno em nosso programa de governo, principalmente à nossa militância.
Escrevo também provocado pela frase do candidato Rossi em entrevista à Folha (23/10): "Quero ver o Zé Dirceu explicar como foi parar no colo do PFL".
Rossi sabe que o apoio do PT a Covas será decisivo para a sua derrota, por isso investe contra a minha pessoa. Partindo de quem foi da Arena, apoiou a ditadura militar, foi secretário de Maluf e apoiou Collor, é evidente que não passa de uma frase de efeito, de simples retórica.
Rossi sabe que o PT repudia a aliança do PSDB com o PFL. Nosso apoio se dá simplesmente porque se trata do 2º turno, cujo caráter predominante é o voto por exclusão, principalmente numa situação como a de São Paulo.
Mas Rossi merece uma resposta à altura. Não explicou até hoje ao povo de São Paulo o seu patrimônio. Político, de prefeito a candidato a governador, acumulou um patrimônio que não consegue explicar. Mente para o povo de São Paulo e essa mentira precisa ser desmascarada.
Não bastasse o monopólio dos meios de comunicação, o abuso do poder econômico nas eleições, o uso ilegal e imoral de recursos públicos, agora temos um candidato querendo introduzir na política a religião. Usando e abusando do nome de Deus, Rossi tenta induzir o eleitor cristão e a população pobre, religiosa, a votar nele apenas porque ele é um homem de fé. A fé de Rossi é falsa. Reafirmo: ele é um falso profeta.
Não foi um bom administrador como apregoa. Não priorizou a saúde, a educação e o saneamento básico quando administrou Osasco (SP). É um político dedicado ao populismo e às grandes obras que só interessam a alguns grupos. Basta ver o estádio e o centro cultural inacabados, que consumiram mais de US$ 30 milhões. Suas obras são apenas de fachada, de impacto.
Na campanha provamos com documentos que eram apenas propaganda. Lá estavam as viaturas Lada da Guarda Municipal sucateadas. Rossi até hoje não explicou suas relações com o dono da concessionária Lada em Osasco. Coincidentemente, seu comitê em Osasco está instalado num prédio cedido por este mesmo senhor, que foi seu secretário de Habitação e que hoje coordena sua campanha.
Rossi apregoa que saneou a administração pública de Osasco, que demitiu funcionários ociosos, fantasmas. Pura mentira. Demitiu e perseguiu adversários, mas ao mesmo tempo contratou de forma temporária 4.000 funcionários escolhidos por ele, a dedo, entre amigos, apaniguados e cabos eleitorais. A cada seis meses, ilegalmente, renovava esse contrato temporário.
Felizmente, a Justiça obrigou a Rossi a regularizar a situação da administração pública em Osasco, a abrir concursos, pondo fim ao empreguismo. A primeira greve do funcionalismo ele enfrentou com repressão, demissão e represálias. A Justiça, mais uma vez, o obrigou a readmitir os médicos e sindicalistas que demitiu. Esse é o verdadeiro Rossi.
Como prefeito, construiu apenas 35 km de esgoto numa cidade de centenas de milhares de habitantes. A única escola que existia em Osasco subvencionada pelo município, com cursos do primário ao terceiro grau, a Fito, foi na prática transformada por Rossi numa escola paga como outra qualquer. Rossi abandonou a educação. Suas relações escusas com o Bradesco remontam às diminuições de ISS que concedeu ao banco, e explicam o apoio que este sempre lhe deu.
É preciso desmascarar Rossi, barrar a ascensão desse político populista de direita, que admirava Médici, que teceu loas ao AI-5, que colaborou em Osasco com as forças da repressão na época da ditadura militar.
Político tradicional, que passou por vários partidos, sempre apoiando o governante de plantão, inclusive ditadores –até ganhou uma rádio do ex-presidente Figueiredo, avaliada em US$ 700 mil, que sempre usou em sua carreira política–, hoje se apresenta como o antipolítico.
É por isso que, por exclusão, vou votar em Mário Covas no segundo turno, apesar de estar mais do que nunca convencido do equívoco da aliança do PSDB de São Paulo com o PFL e o PTB. De estar mais do que nunca convencido de que o PT não deve participar do futuro governo e deve ficar na oposição.
Tomamos essa decisão independente da nossa posição radicalmente contrária às últimas medidas baixadas pelo governo. O "pacote Real 2", recessivo, liquida a propaganda do PSDB de que o fato de o consumo estar aumentando provava a correção do plano, em benefício da maioria da população.
Pacote monetarista, mostra a incapacidade do PSDB de propor reformas estruturais e revela o caráter eleitoreiro do plano, feito sob medida para que FHC vencesse a eleição.
Mas o PT não guarda rancor. E a demonstração disso é reafirmar que apresentamos para o PSDB e para Covas os seguintes pontos de procedimento: o PT exige um tratamento democrático aos movimentos sociais, particularmente aos sindicatos do funcionalismo público e das estatais e aos movimentos populares; o PT não aceita mais a discriminação às prefeituras que não rezam pela cartilha do governador de plantão; exige uma melhora imediata dos serviços públicos de saúde, educação e uma política urgente para resolver o problema fundiário em São Paulo; o PT não aceita a política que leva à falência dos bancos estaduais e repudia privatizações sem transparência, particularmente das estatais paulistas; quer, isto sim, sua recuperação, democratização e sua transformação em empresas públicas.
O PT, consciente do seu papel em São Paulo, da força de sua bancada e de seus aliados na Assembléia Legislativa, da sua importância e do seu peso nos movimentos sociais e da força da sua militância, vai fiscalizar o futuro governador.
Na oposição estaremos, seguramente, contribuindo para que São Paulo possa, como é o desejo de seu povo, ter um governo honesto e voltado para as prioridades sociais, de participação popular, de parceria. Um governo democrático, que foi a nossa proposta de governo no 1º turno.

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