São Paulo, terça-feira, 15 de novembro de 1994
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Fraudes

JANIO DE FREITAS

Candidatos e mesários são os habituais acusados pelas fraudes eleitorais, mas a verdade é que a Justiça Eleitoral resiste mais ao reconhecimento e punição da fraude do que à prática da fraude. Há nisso, muitas vezes, a motivação de razões políticas e de relações pessoais, mas, de maneira mais geral, o que predomina contra a lisura das eleições é o propósito de preservar a imagem do Judiciário, sempre pronto a encontrar uma suposta solução que não condene o processo eleitoral por ele conduzido.
A relutância do TRE fluminense e do TSE em tomar uma decisão, ante as comprovações da fraude no Rio, ficou bastante evidente. Por estar o Rio sob o foco crítico do país todo, sua eleição para deputados acabou anulada. Em outros casos não menos aberrantes, porém, não houve a evidência da relutância nem a anulação necessária.
A OAB do Amazonas fez denúncias cuja consistência condena em definitivo a eleição amazonense para deputados. O procurador eleitoral Wallace Bastos, em relatório pedindo providências do TRE-AM, demonstrou o uso de milhares de títulos furtados dos cartórios, a adulteração de boletins de urnas, a votação em nome de eleitores mortos, títulos forjados, o preenchimento de votos brancos na apuração. São palavras suas: "As eleições no Amazonas foram grosseiramente fraudadas e o resultado seriamente comprometido". Apesar disso, o julgamento pelo TRE ficou empatado, com três votos a favor e três contra qualquer providência, decidindo-se pelo voto de minerva. E só para recontagem em Manaus e Itacoatiara.
Os dois senadores eleitos por Roraima –Romero Jucá, assíduo frequentador do noticiário de imoralidades públicas, e a já senadora Marluce Pinto– foram condenados à inelegibilidade por três anos, tantos foram seus crimes eleitorais. As evidências foram todas reunidas durante a campanha, mas o TRE local só fez o julgamento depois das eleições. Com isso, os mandatos dos dois só poderão ser impugnados depois das suas diplomações. E até que o TSE faça o julgamento final, o que pode demorar anos, os dois estarão exercendo os mandatos obtidos criminosamente.
Dos 648.073 títulos registrados no Estado de Tocantins, 106.762 são dados como de eleitores fantasmas. Desde bem antes da eleição. Mas o faz/não faz a revisão do eleitorado chegou até a eleição. Além disso, a grande maioria dos votos em separado, de eleitores sem documentação adequada, foi juntada aos demais votos. Ou seja, quando constatado que a identificação recolhida era de alguém que já tinha votado ou não podia votar, não houve como anular estes votos ilegais. Em Tocantins, porém, ficou tudo como se a eleição fosse a mais legítima.
É claro que as eleições são mais comprometidas nos estados menos merecedores das atenções jornalísticas. Ou mais controlados por uma facção política. Daí não se concluirá, porém, que nos demais a legitimidade esteja assegurada ou, constatadas irregularidades, haja as providências apropriadas. Em Embu, município da Grande São Paulo, por exemplo, 28 embalagens de cédulas foram roubadas na noite anterior à eleição. O TRE substituiu-as e fez abrir inquérito. Mas o roubo só pode ter-se originado da intenção de usar as cédulas, provavelmente para substituições na apuração. A ser assim, a providência do TRE não impediu a influência das cédulas roubadas no resultado eleitoral.
Ou se muda tudo nas eleições brasileiras, ou serão todas e sempre ilegitimadas por vários métodos de fraude. E, na mesma medida, pelas relutâncias da Justiça Eleitoral.

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