São Paulo, quinta-feira, 17 de novembro de 1994
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Política industrial e de estabilização

HÉLIO NOGUEIRA DA CRUZ

Os objetivos deste artigo são de defender uma política industrial compatível com o combate à inflação e alertar sobre os riscos da apreciação cambial.
A indústria tem sido a atividade mais inovadora desde o século 18. Mesmo os economistas liberais admitem que em um ambiente de forte incerteza, com a presença de rendimentos de escala e externalidades que caracterizam o avanço tecnológico, as forças de mercado alocam os recursos de forma sub-ótima e assimétrica no espaço.
Os grandes avanços científicos e tecnológicos do capitalismo promovem profundas transformações que exigem flexibilidade e agilidade permanentes, para garantir a sobrevivência a longo prazo. A política industrial tem-se mostrado um valioso instrumento para o desenvolvimento de várias regiões, como o Japão e a Coréia.
A política industrial apresenta-se hoje essencialmente como um conjunto de diretrizes gerais (como o apoio à ciência e tecnologia) e instrumentos genéricos (o crédito, por exemplo). Para alguns casos, justifica-se intervenções pontuais e temporárias.
Esta visão propõe de um Estado menor que o do passado, mas mais forte e estratégico. Descarta um planejamento centralizado e abrangente, que limita a inovação e a criatividade, armas indispensáveis para a manutenção da competitividade. Talvez a principal lacuna nas propostas do presidente Fernando Henrique seja a falta de explicitação do papel a ser desempenhado pela indústria nos próximos anos.
O Brasil encontra-se em um período crítico do processo de estabilização macroeconômica. Neste momento, ainda mais que no passado, a prioridade máxima da política econômica deve ser o combate à inflação. Entretanto, os argumentos dos economistas ligados à questões estruturais não podem ser desconsiderados.
A preponderância momentânea das prioridades do curto prazo não significam o abandono das políticas de longo prazo. Nas atuais condições, a estabilização transforma-se em elemento de política industrial, ao criar um ambiente mais favorável aos investimentos.
As proposições "desenvolvimentistas" talvez tenham predominado, por longos períodos, na condução da política econômica. No passado, o modelo de substituição de importações, que prevaleceu até o final da década de 80, foi marcado pela forte atuação direta do Estado no setor produtivo. Somente com a inequívoca falência deste sistema que se pôde buscar novo modelo econômico.
As políticas de estabilização desde os últimos 20 anos têm sido relativamente epidérmicas, pois não alcançavam a parte mais essencial da economia, seus fundamentos, que são a inserção internacional e o papel do Estado na economia.
Somente com anos de desgaste que ocorre a transição para um modelo econômico mais aberto e menos centralizado é que se criam as condições para a estabilização. Ou seja, a estabilização econômica em curso somente poderá ter resultados se for compatível com o novo modelo de desenvolvimento que está sendo construído. Não se pode imaginar que um "descasamento" entre as políticas de curto prazo e as de longo prazo possa alcançar resultados sustentáveis.
Há vários anos venho propondo que o crescimento das exportações é a variável-chave do novo modelo econômico e da inserção internacional de economia brasileira.
O crescimento das importações também é desejável, principalmente por aumentar as pressões competitivas da economia, mas não tem papel de liderança no processo de desenvolvimento. A eliminação do viés antiexportador do passado, que levou à queda da participação do Brasil no comércio exterior, deverá implicar em maior intercâmbio internacional.
A variável de política econômica mais importante para a inserção internacional é a taxa de câmbio. Não se pode sacrificar, através da apreciação cambial (por fatores especulativos, ligados à entrada de capital financeiro de curto prazo, decorrentes da elevação da taxa de juros doméstica) todos os esforços de construção de base produtiva realizados ao longo dos anos.
Os argumentos da pretensa superioridade da taxa de cambio flexível sobre a fixa não são conclusivos analítica e historicamente. Além disso, o Plano Real talvez tenha de contar com câmbio variando em uma faixa estreita, para poder se tornar a verdadeira âncora do processo de estabilização, principalmente no caso em que o controle monetário se mostrar ineficaz.
No momento, defender as políticas industrial e de estabilização é lutar contras novas apreciações cambiais, para evitar o abraço do afogado.

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