São Paulo, terça-feira, 29 de novembro de 1994
Próximo Texto | Índice

Sepultar o chumbo

Como a Folha já colocou diversas vezes neste espaço, a atuação das Forças Armadas no combate à criminalidade no Rio de Janeiro, em que pese os sucessos até aqui verificados e amplamente chancelados pela população carioca, encerra uma série de riscos que não podem ser ignorados.
As denúncias de que membros de diversas forças envolvidas na operação teriam praticado sessões de tortura em alguns dos detidos causam extrema inquietude e exigem a mais completa e rigorosa apuração. Se as acusações forem de fato procedentes, então se deverá acrescentar agora um sórdido crime à já extensa lista de arbitrariedades que vinham sendo cometidas em nome da missão de limpar o Rio.
Prisões ilegais e buscas sem o devido amparo jurídico são intoleráveis, cabendo ao comando investigar e punir exemplarmente os responsáveis. Ainda assim, é forçoso reconhecer, operações policiais facilmente resultam em casos de abuso de autoridade, até mesmo em países do Primeiro Mundo.
Quando se fala de tortura, porém, o adjetivo "intolerável" torna-se fraco demais para qualificar a atitude. A Constituição de 1988 define, em seu artigo quinto, inciso XLIII, a prática de tortura como crime inafiançável e insuscetível de graça ou de anistia.
Não custa lembrar, o legislador de 88 decidiu atribuir tamanha gravidade ao crime de tortura porque tinha fresco em sua memória o funesto período de desmandos que traumatizou o país e do qual militares participaram ativamente.
Essas circunstâncias exigem que o comando das operações conjuntas no Rio não poupe esforços para apurar as denúncias de modo absolutamente cristalino.
É preciso que as Forças Armadas demonstrem à sociedade que atingiram a maturidade democrática e sabem desempenhar o seu papel de defensoras dos poderes constitucionais. Cabe aos militares agir com todo o rigor para deixar claro que os anos de chumbo estão definitivamente superados.

Próximo Texto: Integrar ou isolar
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.