São Paulo, quarta-feira, 30 de novembro de 1994
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Promotoria recorre de sentença de Paiakan

CRIS GUTKOSKI
DA AGÊNCIA FOLHA, EM REDENÇÃO (PA)

A Promotoria de Redenção (750 km de Belém) vai recorrer da decisão da Justiça que absolveu o líder indígena Paulinho Paiakan e sua mulher, Irekran, das acusações de estupro e atentado ao pudor.
Ao recorrer da absolvição, o Ministério Público vai argumentar que os laudos de corpo de delito e conjunção carnal confirmam a prática de estupro, ao contrário do que concluiu o juiz.
O advogado Leão Di Ramos Caiado Neto, 36, reclamou ontem que a versão da vítima, Sílvia Letícia Ferreira, 20, não foi levada em conta na sentença. A falta de provas convincentes foi o maior argumento para absolver Paiakan.
A promotoria também vai ressaltar que o Paiakan foi cúmplice da agressão porque Irekran não conseguiria imobilizar Sílvia Letícia e introduzir os dedos na vagina da estudante ao mesmo tempo.
Em entrevista ontem à Agência Folha, Sílvia Letícia afirmou que vive reclusa na casa em Redenção (750 km de Belém) porque tem medo de ser atacada por índios caiapós.
Ela se casou no ano passado com o agricultor Ricardo Afonso Cruz, 22, e é mãe de Suzane, de oito meses. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Folha – Como você recebeu a absolvição de Paiakan?
Sílvia Ferreira - Foi um absurdo o que o juiz (Elder Lisboa Costa) fez. Para mim, esse juiz de Redenção foi um canalha, sem-vergonha, não ouviu a minha palavra.
Folha – O juiz alega que os laudos não confirmam o estupro.
Sílvia – Ele não leu direito ou não prestou atenção, porque os laudos acusam, sim, estupro.
Folha – Naquele dia, depois da festa (31/5/92), foi Irekran que começou a te agredir, como concluiu o juiz?
Sílvia – A Irekran me segurou e ele que fez o serviço. Sei que ele (Paiakan) jogou a culpa na mulher, mas a Irekran não tem pênis.
Folha – A Irekran foi acusada de te agredir. Isso aconteceu?
Sílvia – Ela me segurou para que eu ficasse quieta. Agora, foi ele que fez o estupro e enfiou os dedos na minha vagina. Não ela.
Folha – O juiz observou na sentença que os teus advogados poderiam ter acusado Paiakan de agressão física e não de estupro, que não foi comprovado.
Sílvia – Os advogados acusaram ele de estupro porque realmente ele é um estuprador.
Folha – Você conhecia Paiakan antes da festa?
Sílvia – Eu não conhecia ele há muito tempo. Conhecia as meninas dele, que iam lá em casa e pediam para eu ajudar a fazer o dever. Eu fui para a chácara com o motorista dele, o Edilson. Na volta, ele (Paiakan) disse que tinha que me levar porque tinha pedido autorização para o meu pai e a responsabilidade era dele.
Folha – Paiakan te ameaçou após a denúncia?
Sílvia – Me ameaçou sim, inclusive eles pagaram um pistoleiro para andar atrás de nós. Os índios corriam atrás de mim por aqui.
Folha – Durante o processo, ele voltou a te ameaçar?
Sílvia – Voltou. O pessoal da aldeia dele (A-Ukre) não pode me ver na rua que quer correr atrás.
Folha – Alguém te agrediu?
Sílvia – Não me agrediram porque eu não saio mais de casa. Estou arriscada de um índio passar o carro em cima de mim, de eles mandarem bala de uma esquina, pagar um pistoleiro para me matar.

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