São Paulo, segunda-feira, 5 de dezembro de 1994
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Sem cambalacho

Em reportagem especial sobre a Argentina, o semanário inglês "The Economist" critica a incapacidade do governo de levar a cabo uma autêntica reforma institucional, três anos depois de um plano que é tido e havido como bem-sucedido.
O alerta é oportuno, mais ainda para o governo brasileiro, que está prestes a passar por uma transição "sem rupturas". O perigo é exagerar-se esse sentido de continuidade a ponto de transformá-la em continuísmo. A rigor, é necessário mesmo que se produza alguma ruptura no padrão de administração do Estado, se a meta é de fato estabilizar a economia brasileira e aumentar sua eficiência e competitividade.
Fazer a reforma do Estado, entretanto, especialmente na área administrativa, é um enorme desafio técnico e político. Basta lembrar a reforma detonada por Collor, uma operação "desmonte" que acabou tendo muito mais a cara de um "desmanche". Afinal, se Estado grande e pesado é sinônimo de ineficiência e tendência à corrupção, reestruturar tamanho poder é uma operação ainda mais sujeita a todo tipo de desmando e casuísmo.
Há várias questões envolvidas, do funcionalismo excessivo à sobreposição de atribuições, passando pelos corporativismos instalados numa máquina obesa e opaca.
Em suma, o impasse fundamental na reforma do Estado é que se pretenda fazê-la a partir do próprio Estado. Aliás, em várias oportunidades no passado recente observou-se que a própria Secretaria da Administração tornava-se refém dos interesses da máquina.
Para superar esse impasse há uma única solução: tornar o Estado mais transparente, dar acesso a informações que já são, em tese, públicas e criar instâncias de fiscalização abertas à participação da sociedade. Ou seja, a saída é ampliar os instrumentos pelos quais a sociedade possa reformar o Estado, em vez de deixar o desafio nas mãos das corporações nele instaladas.
Ou levantaremos a mesma suspeita, colocada pela "Economist" com relação à Argentina, de que a reforma do Estado afinal possa reduzir-se a um simples cambalacho.

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