São Paulo, domingo, 11 de dezembro de 1994
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Paglia e Sally Tisdale confundem opiniões pessoais com filosofia

WENDY STEINER
ESPECIAL PARA O "THE NYT BOOK REVIEW "

"Talk Dirty to Me" de Sallie Tidsdale, com seu design decorativo e erotismo confessional, quase poderia se encaixar na proverbial mão única. Mas seu convite lascivo é apenas um chamariz. Melancólica, inquisidora, despudorada, Tisdale oferece uma "filosofia íntima do sexo".
Camille Paglia também chama "Vamps & Tramps" de uma "filosofia sexual, mas não há nada de íntimo nele. De fato, Paglia desdenha a própria idéia. "A intimidade mata o sexo", diz. Lógico: a sexualidade é para ela uma questão de imagem.
Mas apesar das diferenças de tom, as políticas de Paglia e Tisdale são semelhantes. Ambas defendem a pornografia, a prostituição, a bissexualidade e a "perversão", e ambas condenam Andrea Dworkin e Catharine MacKinnon, a correção política e inveja do pênis ("o desejo de ser vermelho, enrugado e ter quatro polegadas de diâmetro").
Tisdale, autora de quatro livros e jornalista ("The New Yorker", "Harper's Magazine" e "The New Republic"), foi outrora uma feminista ortodoxa atormentada por suas "fantasias chocantemente incorretas" de subjugação. Sua investigação a levou a assistir a peep shows, ficar plantada em livrarias de adultos para observar os clientes e esquadrinhar as lojas de vídeo. Ela entrevistou prostitutas, avaliou estudos sobre sexo e pesquisou tatuagens e cursos de sadomasoquismo.
O resultado é uma justificação apaixonada e pessoal da pornografia e liberdade sexual. Tisdale reconhece a diferença crucial entre olhar algo e representar aquilo que se vê. "A terra da fantasia é a terra do não-fiz e gostaria-de", escreve, defendendo que a pornografia deve ser politicamente incorreta.
Tisdale também mistura referências a Kinsey e ao cromossomo 23 com passagens de erotismo reveladoras: "Tesuda ... significa querer suor, mas também pele, tocar e ser tocada, qualquer lugar, chupar e lamber, ser penetrada, sentir um dedo escorregando entre os botões da minha camisa e, então, nos meus seios".
Mas muitas vezes suas corajosas revelações deixam-nos indiferentes. Todo o poder das fantasias repousa no fato de serem feitas sob medida para aquele que cria a fantasia; toda a arte da pornografia repousa em talhar a fantasia privada para o público. Dividido entre o polêmico e o confessional, livro de fatos e pornô soft, "Talk Dirty to Me" não oferece nem a prosa imortal, nem a análise brilhante e nem a excitação sexual.
"Vamps & Tramps" é de uma rara confusão. É um compêndio dos pensamentos de Paglia e de seus triunfos na mídia desde sua ascensão de professora a celebridade.
Dois apêndices do livro contêm inúmeros cartuns e resumem artigos que Paglia inspirou.
O que quer que se pense do programa de reforma educacional de Paglia –com religiões mundiais como cerne de seu currículo e com mitologia indistinguível de relações públicas de Hollywood– deve-se admitir que ela está se divertindo mais que a maioria dos acadêmicos. Divertida, exagerada, Paglia lança uma bomba de absurdo na academia.
O único problema é que Paglia exige que levemos suas palhaçadas a sério. Quer que enxerguemos não apenas a verdade em sua hipérbole, mas a hipérbole como verdade, o mundo como imagens, personagens e mágica de mídia.
As incursões de Paglia e Tisdale nas guerras do sexo trazem muito prazeres ao leitor. Mas existem melhores alternativas para as teorias sexuais de direita e esquerda que essas vozes auto-indulgentes. Gertrude Stein disse que comentários não são literatura. Poderíamos acrescentar que opiniões tampouco são filosofia.

Tradução de Vera de Paula Assis

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