São Paulo, segunda-feira, 12 de dezembro de 1994![]() |
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Promessa não cumprida
CARLOS ALBERTO IDOETA No último sábado, 10 de dezembro, celebrou-se mais um aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Texto ecumênico das Nações Unidas, prometeu o melhor dos mundos: nunca mais medo e miséria, em resumo. Cumpriremos quando a promessa de 1948?Que mundo será este nos próximos dez anos? Onde vão atuar os que protegem e promovem os direitos, pergunta-se a Anistia Internacional. Militantes buscam novos papéis, debatemos e arriscamos as tendências prováveis. Nos une a exigência de outras estratégias diante de realidades em rápida mudança. O fim da Guerra Fria deixou a sensação de perda de algo: a bipolaridade que resistiu de 1945 até a década de 80, o maniqueismo de que alguns ainda precisam para lidar com o caos aparente e o declínio do papel do Estado-nação. Emergem outras organizações políticas e econômicas internacionais. Cada vez mais decisões que afetam a vida das pessoas são tomadas por atores fora do elenco estatal, e os efeitos não são uniformes. As novas democracias latino-americanas, africanas e asiáticas seguem vulneráveis às crises econômicas, à corrupção endêmica e a movimentos extremistas. Na Europa são imprevisíveis as consequências das ondas de refugiados políticos e econômicos num ambiente de mais intolerância e xenofobia. O fundamentalismo islâmico –ameaça à diversidade como seus homólogos de outras crenças –se expande no Oriente Médio, onde a democratização não avança, e em partes da África, Ásia e ex-URSS. Governos latino-americanos estabelecem comissões oficiais de direitos humanos enquanto cometem ou toleram atrocidades contra seus cidadãos. Autoridades em latitudes várias tentam sequestrar o vocabulário humanista e relativizar valores da própria espécie, atentando contra a universalidade dos direitos. O hiato entre pobres e ricos pode crescer, nacional e internacionalmente. Alguns países asiáticos prometem altas taxas de crescimento, mas muitas economias africanas apontam para a estagnação. A América Latina prova a liberalização comercial prenunciada pela Rodada Uruguai e os ajustes estruturais recomendados pelo FMI. Parece alto o risco de colapso em alguns países europeus orientais, onde a democracia não atende os anseios de parte da população. Os movimentos migratórios continuarão no rumo do sul pobre para o norte industrializado, e das zonas rurais para as cidades. De uma classe média maior e mais educada sairão mais militantes para partidos, sindicatos e outras organizações não-governamentais. As ONGs são a novidade em resposta à ineficácia e à corrupção do Estado. Podem ser grandes aliadas da Anistia na causa decisiva de asserção dos direitos da pessoa, mas algumas parecem propensas à instrumentalização política ou à sua própria corrupção. No próximo decênio continuarão os conflitos armados, e ainda inexistem substitutos para os antigos mecanismos de negociação e manutenção da paz. Crescem assim as chances de impunidade para os criminosos em cenários bélicos e as dificuldades para as organizações humanitárias. A saída de cena das superpotências abriu espaço para novas facções armadas, como nos exemplos notáveis da ex-Iugoslávia, Ruanda e Somália. Não há sinais de menos recurso à tortura, generalizada no planeta, e às execuções extrajudiciais, que aumentam com as guerras. Vaticínios sombrios que contrastam com a provável redução do número de presos de consciência e com a tendência rumo à abolição da pena de morte, na legislação pelo menos. Como antes, os autores das violações não serão só os funcionários públicos. Os barões do narcotráfico nas Américas, o crime organizado no Leste Europeu e as milícias privadas na África são vistosos exemplos do banditismo não-governamental. Atrocidades em escala maciça poderão causar novos contingentes de refugiados. Os avanços tecnológicos facilitam a coleta e a distribuição de informação sensível. As "avenidas globais" são recursos hodiernos para se enfrentar a censura desejada pelos violadores e para a publicidade solidária, tão cara às vítimas. A solidariedade, atestam os estudiosos da mente humana, não é um impulso psíquico primário, como o amor ou o ódio, e não implica, como a caridade, numa relação vertical. Horizontal, ela reconhece no outro um semelhante e um titular de direitos. A solidariedade não tem geração espontânea mas pode crescer de uma educação, formal e informal, que forme, mais do que o especialista, o cidadão da polis planetária. A diversidade é o novo, protegê-la e promovê-la é o desafio de governantes e militantes. Texto Anterior: O Supremo e as emendas constitucionais Próximo Texto: Lucena ; BC no Rio ; Erro de avaliação; Fuvest; Médico 'estrela'; Índice |
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