São Paulo, sexta-feira, 16 de dezembro de 1994
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O Setor privado e o estado na economia brasileira

OSVALDO MOREIRA DOUAT

Desde a segunda metade dos anos 80 se observa uma permanente pressão pela mudança no padrão de intervenção do Estado na economia brasileira.
Nos anos 90, diversos avanços foram conquistados. As iniciativas de desregulamentação das atividades econômicas e desmonte dos instrumentos tradicionais de fomento, baseados em subsídios e incentivos, o início do programa de privatização e a implementação de políticas voltadas para o aumento de competição.
O setor privado tem reagido positivamente a este novo ambiente. Por um lado, a indústria lançou-se em importante processo de reestruturação, orientado, fundamentalmente, para o aumento da produtividade e qualidade. Por outro, não se emitiu diante das iniciativas concretas de redução da participação direta do Estado na atividade produtiva, assumindo forte presença no aporte de capital que já viabilizou a privatização de significativos setores da economia.
O vigor do setor industrial no combate as suas ineficiências ganha maior relevo quando se observa que este movimento ocorreu em condições macroeconômicas adversas caracterizadas por taxas de inflação excepcionalmente elevadas, recessão, juros reais em níveis proibitivos e valorização da taxa de câmbio real.
Apesar deste ambiente desfavorável, não há dúvidas que a indústria brasileira se encontra hoje muito mais competitiva do que ao final da década passada, mais voltada para o exterior, incrementou as exportações e experimentou um aumento de sua produtividade da ordem de 23% entre 1989 e 1993.
As iniciativas de reestruturação têm-se concentrado na criação e ampliação de programas de qualidade, na racionalização das linhas de produção e no aumento do treinamento dos recursos humanos, cuja qualificação é identificada como o mais importante fator competitivo para os anos futuros.
O Programa Nacional de Desestatização, criado em agosto de 1990, já exibe resultados expressivos, refletindo, inclusive, o vigor e o dinamismo dos capitais privados nacionais, que não estão se omitindo em participar com significativos investimentos em importantes setores que anteriormente eram controlados pelo Estado.
O programa de redução do setor produtivo estatal proporcionou, até janeiro de 1994, a privatização de 25 empresas, envolvendo uma arrecadação da ordem de US$ 7,1 bilhões. Um exemplo de sucesso foi a privatização do setor siderúrgico. Também no setor petroquímico está em andamento semelhante processo de redução da participação estatal.
A agenda de redefinição do papel de atuação do Estado na economia brasileira está longe de estar concluída. O Estado deve concentrar seus recursos em áreas de sua inequívoca competência, a exemplo da provisão da educação básica, da saúde pública e da segurança, deixando de intervir em setores nos quais a iniciativa privada pode oferecer bens e serviços.
É preciso aprofundar o processo de privatização, eliminando as atuais restrições constitucionais à participação do capital privado em alguns setores específicos, como telecomunicações e petróleo. No mesmo sentido, se faz necessário eliminar as restrições ainda existentes à participação de capitais externos no processo de desestatização.
Igualmente importante é a aprovação de legislação que regulamenta a concessão de serviços públicos. As atuais restrições constitucionais ao capital estrangeiro devem ser eliminadas para garantir eficiência, competitividade e novas oportunidades de investimento na economia brasileira, dando lugar a uma atuação ainda mais expressiva do setor privado.
A diminuição da atuação do Estado também é necessária em diversas dimensões regulamentatórias. Um exemplo destacado, a ser perseguido, diz respeito à reforma do modelo das relações do trabalho, em que atualmente a participação do Estado é excessiva. O princípio fundamental que deve reger o novo modelo é de negociação.
Não pode deixar de ser mencionada a necessidade de mudança radical no sistema tributário e previdenciário brasileiro. Tornou-se absolutamente necessário eliminar as distorções atualmente observadas no sistema tributário, que impõe ônus às exportações e aos investimentos, implica altos custos acessórios decorrentes do grande número de tributos e da complexidade das respectivas legislação e concentra a carga tributária em um número reduzido de contribuintes.
O equilíbrio do sistema previdenciário passa por uma forte reformulação do modelo atual, que é inviável e incentiva a informalização do mercado de trabalho. A mudança mais importante a ser realizada corresponde à criação de uma aposentadoria universal suportável pelo Orçamento da União complementada por fundos de pensão privados.
Um grande desafio na agenda de redefinição do papel do Estado está associado à constituição de amparos institucionais adequados à nova fase de desenvolvimento. A eleição de políticas pró-competição e a maior integração à economia internacional tornam vital que o Estado esteja aparelhado para gerenciar com efetividade novas instituições, a exemplo dos órgãos de defesa da concorrência, entidades de proteção ambiental, órgão de defesa do direito do consumidor e mecanismos de proteção contra práticas desleais de comércio, como a prática de dumping.
A operação destas instituições requer uma administração pública profissional e eficiente, o que representa, por si só, um importante desafio que terá que ser superado pelo próximo governo.
O futuro da economia brasileira, portanto, depende precisamente de vontade política do novo presidente e do novo Congresso Nacional, a partir dos seus primeiros dias de atividades.

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