São Paulo, segunda-feira, 19 de dezembro de 1994
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Educação sexual resolve evasão escolar

MARCELO PAIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Pegou mal por aqui a decisão do nosso glorioso STF de inocentar Collor por falta de provas. Pior ainda foi a repercussão do caso Lucena. Apresentadores de telejornais não contiveram a ironia. Era como se dissessem, nas entrelinhas, "como são estranhos estes povos do Terceiro Mundo". Se algo semelhante acontecesse por aqui, pipocariam rebeliões: saques, quebradeiras e queima de pneus.
Por muito menos, a rapaziada daqui entra pelo esgoto. Se um candidato a cargo público teve, no passado, um vacilo irreparável, tipo ter empregado um imigrante ilegal, faz as malas e volta pra casa. Se alguma estrela do esporte ou de Hollywood deixou de declarar para o imposto de renda tim-tim por tim-tim, são dois anos de cana.
Se uma secretária for cantada pelo "boss", pimba: fatura US$ 1 milhão de indenização. Se você for queimado pelo café do macdonald's, US$ 7 milhões no bolso. Se tropeçar na rua, processa o responsável pela calçada. Se for atropelado, pode ir fazendo os planos e reservar uma primeira classe para a ilha mais paradisíaca do Caribe.
Dra. Joycelyn Elders, "surgeon general" do governo Clinton (não tenho a menor idéia de como traduzir isto, nem sei se existe similar nacional, mas para não deixar você nas nuvens, "surgeon general" é uma espécie de ministro da Saúde, responsável, entre outras coisas por campanhas oficiais de prevenção à drogas, tabaco e Aids), acaba de ser demitida, depois de declarar que "falar às crianças, nas escolas, sobre masturbação, faz parte da educação sexual".
Dra. Elders, uma respeitável senhora com cara de avó, considerava a idéia de incluir a masturbação no currículo dos pimpolhos americanos, o que gerou um escândalo sem tamanho. Ganhou manchetes, levantou a ira dos católicos e conservadores afins. Está sem emprego, apesar de coberta de razão.
É fato comprovado que um adolescente gasta mais tempo se masturbando que estudando. Se aprovada a sugestão de vovozinha Elders, haveria uma brilhante desculpa para ficar trancado horas no banheiro: "Estou fazendo o dever de casa, pô!"
Imagino a bela professorinha (ou professorzão) desenhando, no quadro negro, novas fórmulas, novas técnicas. Imagino um seminário, um trabalho em grupo, uma prova oral?! Diminuiria, e muito, a evasão escolar e aumentaria muito a concentração e o desempenho das futuras gerações. Muito marmanjão iria querer voltar para a escola. Me incluo no grupo, sim senhor.

MARCELO RUBENS PAIVA está em San Francisco (EUA) como bolsista da Knight Fellowship na Universidade de Stanford

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