São Paulo, domingo, 25 de dezembro de 1994
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AS LENDAS DA POLÍTICA

"No Brasil, criou-se uma falsa lenda. Associa-se a qualidade de democrata à posição de esquerda. A esquerda em geral não é democrata. Posso dizer porque fui comunista. Lutávamos confessadamente pela ditadura do proletariado, que resultou em ditaduras pessoais e violentas.
Democracia não tem nada a ver com ideologia. Democrata a gente é ou não é. Ou se é autoritário ou se é democrata. Durante muitos anos não houve ninguém mais maniqueísta que eu. Basta pegar meus primeiros livros, tudo o que é rico é ruim, tudo o que é pobre é bom. Demorei a aprender que as coisas e as pessoas são complexas. Hoje tenho horror a ideologias."
As lições do partido
"Fui comunista muito cedo, não sei nem como. Éramos naturalmente comunistas. Em 1955, cumpri minha última tarefa. Estava farto de me dizerem 'você tem que fazer isso'. Comecei a luta para pensar pela minha própria cabeça, que continua até hoje. No entanto, nunca me tornei anticomunista. O partido me ensinou um bocado de coisas. Aprendi a ouvir sem interromper, a ter disciplina sobre mim mesmo, o que é importante para um escritor."
Vida de sombra e sol
"François Miterrand, é um grande estadista, o construtor da Europa. Achei sua última entrevista impressionante, o que contou sobre sua juventude, seu envolvimento com o nazismo. É um homem que viveu muito, tem um lado de sombra e um lado de sol. Pensar a mesma coisa a vida toda é uma idiotice total e completa."
O livreiro-presidente
"Outro político que considero importante é Mário Soares. Eu o conheci em 1948. Era exilado político em Paris. Vivia no mesmo hotelzinho da Rive Gauche onde eu vivia, o Hôtel Saint Michel.
Tinha uma pequena livraria portuguesa. Quando voltou para Portugal, com a Revolução dos Cravos, vendeu a livraria para Miguel Arraes.
Mário é um homem de grande qualidade humana, um dos raros homens que o poder não mudou. Nasceu para ser presidente, é adorado em Portugal."
Cadê o estadista?
"Sou amigo de muitos políticos brasileiros, mas se você me perguntar se existe um grande estadista no Brasil, direi que não. Fernando Henrique pode se tornar um, não sei.
Há, no entanto, homens de grande qualidade, na capacidade administrativa, no amor ao Brasil, ao povo, à cultura. Dou dois exemplos, de posições políticas diferentes: Antônio Carlos Magalhães e Miguel Arraes."

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