São Paulo, terça-feira, 1 de fevereiro de 1994
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A cartilha de uma frase

JANIO DE FREITAS

Mais duas confirmações, recolhidas pela repórter Míriam Leitão, de que o plano de Fernando Henrique até hoje não saiu dos esboços para as definições.
De Pedro Malan, sobre a recomposição do papel institucional do Banco Central, "indispensável para garantir o sucesso do plano de estabilização": "Às vezes alguém me pergunta como exatamente será isso, mas nós não sabemos". Nem o que "é fundamental" está definido, pois.
Do próprio Fernando Henrique, falando sobre a advertência exposta pelo professor Mário Henrique Simonsen, de que a adoção da URV pode provocar a hiperinflação: "o governo vai preparar uma série de medidas alternativas para serem adotadas no caso de a passagem para a URV acelerar a inflação'(...) "Precisamos ter uma bateria de medidas para serem adotadas caso a inflação suba". A esta altura, menos de uma semana depois de Fernando Henrique divulgar que esperava adotar a URV depois do carnaval, a equipe econômica nem tem certeza, ainda, se a URV combate ou acelera inflação.
A equipe comunica que prepara, no entanto, uma cartilha sobre a URV, que ela ainda não sabe o que será. A primeira frase da cartilha já deve estar pronta: Ivo não viu a URV.
Já para o divã
Não sei se o deputado Odacir Klein estava sóbrio quando, a meio dos seus lazeres de improvisado praieiro gaúcho, resolveu assacar calúnia contra mim. Se, por acaso, naquele momento estava sóbrio, suas palavras não escaparam de estar bêbedas.
O acesso de Klein, que é uma espécie de José Lourenço que cresceu, deu-se a pretexto de ter sido "injustamente criticado" por pedir à Mesa da Câmara a inocentação de dois deputados, para os quais a CPI do Orçamento propôs mais investigações. O artigo em questão não foi, porém, sobre o pedido de Klein, mas sobre a autoritária e ilegítima atitude da Mesa, fazendo inocentações por conta própria. Odacir Klein só foi citado na 39.ª linha do artigo, de passagem, apenas para situar a origem do ato incabível da Mesa: "Em atenção a cartas do relator e do vice-presidente da CPI, Roberto Magalhães e Odacir Klein, reconsiderando partes do relatório de que tanto se autolouvaram". O que há aí são dois fatos e nenhuma "crítica injusta": a autoria das cartas, desde vários dias reconhecida publicamente por Magalhães e por Klein, e a autolouvação ao se encerrar a CPI, como as TVs exibiram e o videotape registrou.
Pela "crítica injusta" que não houve, Klein me desafia para um debate em rádio ou TV. Mas seu caso não é debate a dois. É de análise a dois. Psicanálise. Sem o debate, pede que lhe ceda este espaço, para que explique a intervenção em favor dos deputados. Também não é o caso. Em mais de 10 anos de coluna, nenhum outro do gênero Klein provou, na Justiça ou fora dela, que aqui se tivesse cometido uma só calúnia. Logo, não é lugar onde Klein pudesse exercer seu hábito.
O deputado disse "desconfiar" que estou "na gaveta de alguém dos sete anões". "Desconfiar"? Quer dizer que, depois de 93 dias vasculhando a movimentação financeira e patrimonial dos "sete anões', o vice-presidente da CPI não é capaz de uma afirmação segura sobre pagamento, pelo menos, por "alguém dos sete anões"? Então não será por causa de "críticas injustas" que Klein não se candidatará à reeleição, como diz, mas pela justeza das críticas, até brandas em relação à que ele próprio faz à CPI e ao seu trabalho nela.
Mas Klein tem bastante tempo para refletir sobre a tentativa de reeleição e vai fazê-lo: como deputado, ele engaveta sua responsabilidade penal nas imunidades parlamentares e comete calúnias com a certeza de que fica impune. Nem só de dinheiro do Orçamento se fazem deputados-anões. As imunidades fazem também anões morais.

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