São Paulo, sábado, 12 de fevereiro de 1994
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'Vidas Secas' une no mesmo espaço os destinos da terra e do homem

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Filme: Vidas Secas
Produção: Brasil, 1963, 103 min.
Direção: Nelson Pereira dos Santos
Elenco: Átila Iório, Maria Ribeiro, Jofre Soares
Onde: hoje, às 21h, no Espaço Banco Nacional de Cinema

"Vidas Secas" é um filme em que a câmera parece sempre apontar para a terra, fazer dela seu principal personagem. Mas, como boa parte é filmada em planos largos, existe também o céu. Embaixo, existe a secura. Em cima, o império do sol (ou seja, a perspectiva de perpetuação da seca).
Entre os dois ficam os personagens propriamente ditos: o casal de retirantes, seus filhos, a cadela Baleia. Foi a primeira adaptação que Nelson Pereira dos Santos fez de um romance de Graciliano Ramos, seu primeiro filme magistral.
O que Pereira dos Santos conseguiu, em primeiro lugar, foi conseguir uma formidável integração entre personagens e paisagem. Não existe descontinuidade entre o destino dos retirantes que fogem da seca do Nordeste e os caminhos que trilham.
Existe no cenário uma espécie de morte que os retirantes levam consigo: o abandono, a falta de perspectivas, o crescendo da angústia e, sobretudo, a certeza que se adquire ao longo de cada sequência de que o movimento do grupo de personagens se dá numa espécie de labirinto. Como se o espaço –que a princípio parece determinar os destinos– fosse engolido pela própria caminhada, pela progressão num caminho não leva a parte alguma.
E como se, em vez de retirantes, estivéssemos às voltas com seres errantes, sem qualquer perspectiva de vida. Este filme duro e arejado consegue estrair do realismo uma visão generosa e cheia de carinho, ao mesmo tempo em que desenvolve uma reflexão aflita sobre o Brasil e suas perspectivas. É uma obra-prima. É, até hoje, o melhor filme do diretor.

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