São Paulo, sábado, 12 de fevereiro de 1994
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Eventos homenageiam Julio Cortázar

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

Hoje faz dez anos que morreu Julio Cortázar (1914-84), um dos grandes escritores da segunda metade do século. Entre os eventos que estão programados em sua homenagem em diversos países (leia textos abaixo), os mais importantes são o lançamento, na Argentina, de um livro inédito de contos do escritor, e a publicação no Brasil, pela primeira vez, de uma de suas obras mais importantes, "As Armas Secretas".
Cortázar nasceu em Bruxelas (Bélgica) e morreu em Paris, poucos anos depois de ter-se tornado cidadão francês. Mas sempre se considerou um escritor argentino e escreveu em espanhol toda a sua vasta obra, que inclui romances, contos, poemas, ensaios, livros de viagem, memórias e textos que misturam todos esses gêneros.
Se Borges foi um autor admirado universalmente pela elegância e perfeição de sua prosa, Cortázar conquistou pelo mundo afora uma comunidade de leitores que o amavam como a um amigo próximo. Nenhum escritor contemporâneo entrelaçou como ele a competência narrativa, a experimentação formal e a militância político-social.
Homem de esquerda, foi muito criticado por sua aproximação com os comunistas de Cuba e da Nicarágua, mas sempre manteve uma postura crítica diante do autoritarismo e da burocracia socialista.
Herdeiro de românticos e surrealistas (escreveu ensaios sobre Edgar Alan Poe e Antonin Artaud), Cortázar manteve-se fiel ao objetivo de aproximar a arte da vida. Seu último grande livro, "Os Autonautas da Cosmopista", reconstitui a aventura que ele, aos 67 anos, realizou ao lado da mulher, Carol Dunlop, viajando e acampando durante um mês nas margens da rodovia Paris-Marselha.
Nutria uma paixão particular pelo tango, pelo boxe e pelo jazz –temas que aparecem em inúmeras de suas obras. Pretendia ser um "cronópio", personificação do lúdico e do poético criada por ele no livro "Histórias de Cronópios e de Famas". Cronópios, para ele, eram Louis Armstrong, Harpo Marx e Charles Chaplin.
Embora seu nome tenha ficado associado irreversivelmente ao fantástico, graças à atmosfera de muitos de seus contos, sua obra mais importante e revolucionária é o romance "O Jogo da Amarelinha", textl fragmentário e lúdico (cada leitor pode lê-lo na ordem que preferir) sobre a crise do homem latino-americano desterrado na Europa.
A ligação de Cortázar com o Brasil sempre foi muito estreita. Admirador de Clarice Lispector e Osman Lins, amigo de Haroldo de Campos, amante da música popular brasileira (chega a citar Gal Costa no conto "Orientação dos Gatos"), alvo de uma importante tese universitária paulista ("O Escorpião Encalacrado", de Davi Arrigucci), o escritor veio ao país diversas vezes e teve seus principais livros editados aqui.
A grande exceção até agora era o volume de contos "As Armas Secretas" (1959), que a José Olympio promete publicar em agosto, com tradução de Eric Nepomuceno. O mesmo Nepomuceno traduziu há dois anos para a José Olympio o esclarecedor "O Fascínio das Palavras", longa entrevista de Cortázar ao jornalista uruguaio Omar Prego.
O ineditismo em português de "As Armas Secretas" era uma lacuna grave. Entre os cinco relatos do livro há pelo menos duas obras-primas do escritor: "El Perseguidor", sobre o músico americano Charlie Parker (batizado no conto de Johnny Carter), e "Las Babas del Diablo", que inspirou no cinema o clássico "Blow Up", de Michelangelo Antonioni.
A editora José Olympio decidiu lançar o livro em agosto para comemorar os 80 anos de nascimento de Cortázar. Acompanhando o lançamento, ocorrerá no Rio –em local ainda não definido– uma série de eventos em sua homenagem, incluindo exposição de fotos, exibição de vídeo com entrevistas, noites de jazz e tango e sessões dos filmes "Bird", de Clint Eastwood (sobre Charlie Parker), e "Blow Up".

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