São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 1994
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Nelson pereira faz só meio filme

SÉRGIO AUGUSTO

O cinema brasileiro faz enfim sua "rentrée" com "A Terceira Margem do Rio". Atrás das câmeras, nosso mais prestigiado cineasta, Nelson Pereira dos Santos. Atrás de sua(s) intriga(s), o mais moderno dos nossos prosadores, Guimarães Rosa. Nelson tem muito a ver com Graciliano Ramos (fonte de seus maiores acertos: "Vidas Secas" e "Memórias do Cárcere"), mas não se afina com Machado de Assis (vide "Asyllo Muito Louco") nem muito, vê-se agora, com Rosa, apesar dos belos momentos que a primeira parte de seu novo filme contém.
É bom o uso da paisagem rural (interior de Minas) e particularmente brilhante toda a sequência em que uma vaca casamenteira arrasta seu dono até a fazenda de sua futura amada. Na roça, a singeleza narrativa de Nelson faz tudo fluir como um rio. Ou melhor, quase tudo, pois os atores não se mostram à altura da riqueza de algumas imagens nem das falas roseanas, que acabam soando artificiais.
Quando a ação se desloca para a periferia de Brasília, não é só a paisagem que muda para pior. Como que mimeticamente afetado pelo novo meio ambiente, "A Terceira Margem do Rio" se vulgariza, perde o rumo, desperdiça idéias sugestivas e se entrega ao facilitário do realismo fantástico. Aí, para azar de todos, o Nelson de "Vidas Secas" se deixa dominar pelo seu Mr. Hyde, o Nelson de "Estrada da Vida" e "Tenda dos Milagres", forçando a mão do exotismo. Até um desfile de figuras carnavalescas irrompe na tela, sem mais nem menos, para realçar o colorido tropical.
Nelson, em suma, fez meio filme. E a segunda metade, por mais que tente, não tem a mesma força, a mesma pureza e a mesma originalidade de "O Amuleto de Ogum".
A Terceira Margem do Rio. Brasil, 1994. Direção de Nelson Pereira dos Santos. A estréia estava programada para sexta, 18, no Espaço Banco Nacional de Cinema/ sala 1: 16h, 17h50, 19h40 e 21h30.

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