São Paulo, quinta-feira, 24 de fevereiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Porque podemos ter os 5 no ataque (2)

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, vamos dar sequência aos argumentos que mostram que a tese da escalação de Edmundo, Bebeto, Romário, Dener e Muller é não só viável, como também desejável.
Nós já vimos na terça passada que a) é teoricismo improdutivo ficar discutindo esquemas táticos abstratos sem levar em consideração as reais características de jogo dos melhores atletas que dispomos (e o bom da safra atual é bastante ofensivo) e b) que as grandes seleções que marcaram a história do futebol foram seleções que inovaram taticamente –e não se submeteram aos canônes e tabus paralisadores do estágio do futebol em cada época.
Um caso clássico citado até hoje foi o da memorável seleção húngara de 1954, que inventou um lugar para a genialidade do Puskas. Para citar um exemplo mais atual, a seleção alemã procura iteligentemente um lugar para o talentoso de construtor de jogadas que é o Mattheus. Veja bem: estão procurando adaptá-lo às funções de líbero, mas isto implicará necessariamente –e aí está a invenção germânica– em inverter as funções tradicionais do chamado líbero. Com certeza, Mattheus não é um insuperável destruidor de finalizações adversárias como é o milanês Baresi, talvez o jogador que tenha melhor conceituado o líbero com esta caracterísica.
O que ocorre então? Os alemães estão procurando dar um perfil mais de construção do que de destruição para a figura tradicional do líbero. Um líbero para jogar para frente. Daí a introdução de um princípio de ataque em um setor que é considerado como uma das peças fundamentais e um dos verdadeiros tabus nos sistemas defensivos europeus. Pois bem, se a Alemanha está procurando uma alternativa para escapar da mesmice dos chamados modernos sistemas de marcação, porque não nós, brasileiros, que sempre tivemos a nosso favor a facilidade de construir jogadas?
Outro exemplo contemporâneo. Todos nós estamos vendo o renascimento do futebol do holandês Gullit na Sampdoria –depois de ter sido praticamente limado do futebol pelo atualmente medíocre (e sortudo) Milan. Entre os rubro-negros, ele atuou basicamente dentro do conceito de ala pela direita (embora, nos gloriosos tempos de Arrigo Sacchi, gozasse de uma liberdade tática relativamente maior). Na Samp, passou a jogar mais recuado, com autonomia para subir ao ataque a qualquer momento. Embora seja um jogador de grande porte físico, de muito voluntarismo em campo e disciplinado taticamente, Gullit não é propriamente famoso por ser obstrutor de jogadas. Sua mudança de funções, até agora com êxito, deveu-se a dois fatores: a) a Samp resolveu armar um esquema para aproveitar o que ainda pode ser queimado do seu talento (e não o contrário) e b) o time deveria estar sentindo que precisava enfatizar mais os princípios de construção de jogadas em um setor que era basicamente de marcação. Se a seleção holandesa aceitar o novo Gullit –ele mesmo parece estar querendo– como a alemã está aceitando o novo Mattheus, teremos a possibilidade de observar curiosas inovações táticas.
Em resumo, o que isto quer dizer é que o futebol atual congestionou de tal maneira o meio-de-campo, que os times estão procurando alguma luz não no fim, mas no começo do túnel, isto é, estão procurando definir as suas estratégias de condução da bola até a área adversária a partir da sua própria intermediária. Depois de anos enfatizando os princípios de defesa nos ataques, o futebol começa a se preocupar com os princípios de ataque nas defesas. No sábado a gente continua a explicar porque podemos term Edmundo, Bebeto, Romário, Dener e Muller.

Texto Anterior: Guga dá vitória ao Santos no Japão; O NÚMERO; Banespa e Palmeiras jogam por liderança; Roberto Durán quer quinto título mundial; John McEnroe perde torneio em Roterdã; Sampdoria bate o Parma e é finalista; Ator vai treinar o Botafogo-PB
Próximo Texto: A primeira vez
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.