São Paulo, sábado, 26 de fevereiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Por novas regras

Apesar dos imensos percalços no campo da economia, o Brasil evoluiu muito, nos últimos nove anos, desde a redemocratização, em termos de remoção do que se convencionou chamar de "entulho autoritário". Mas, paradoxalmente, um entulho do gênero, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), permanece em vigor, apesar de ser legado de um período autoritário anterior ao ciclo militar. De fato, a CLT é do governo Vargas e está inspirada na "Carta del Lavoro" da Itália fascista.
Só por esse aspecto institucional, já seria elogiável a decisão do governo de, na prática, sepultar a CLT com a introdução dos contratos coletivos de trabalho. Na essência, tais contratos significam uma negociação direta entre empregados e empregadores para definir todas as regras da relação capital/trabalho em uma determinada empresa ou segmento da economia. Ao governo só cabe estabelecer um marco legal genérico que lhes dê sustentação e impeça que impere a lei da selva.
Em diversos países desenvolvidos, os contratos coletivos tornaram-se a regra nas relações trabalhistas. Variam apenas as formas. Nos EUA e REino Unido, por exemplo, a negociação se dá em cada empresa. Na Espanha, ocorre por setores de atividade econômica.
O caso da Espanha, aliás, é o que permite melhor comparação com o Brasil. Durante os 40 anos do regime franquista, a legislação trabalhista tinha o viés corporativo que marca a CLT brasileira. Mas logo nos primeiros anos após a redemocratização espanhola, ocorrida em 1977, varreu-se esse tipo de entulho e entronizou-se uma lei moderna.
A introdução dos contratos coletivos no Brasil, que o governo anuncia como passo concomitante à troca de moeda, colocará desafios tanto ao setor empresarial como aos sindicatos de trabalhadores, o que sempre ocorre quando se ensaiam modificações em situações esclerosadas pelo tempo.
Mas o simples fato de que nem um lado nem o outro poderá escudar-se no Estado para proteger interesses ou reivinidicações eventualmente ilegítimas tenderá a criar um senso de responsabilidade que só poderá ser benéfico para ambas as partes -e, por extensão, para o país.

Texto Anterior: Queda passageira
Próximo Texto: A utopia e a rendição
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.