São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 1994
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Inflação e burrice

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – O anúncio da nova fase do plano econômico está previsto para amanhã, mas ontem, aqui em Brasília, o conflito dentro do próprio governo permanecia aceso. Motivo: salários. Prosseguia a pressão dos militares apoiados nos ministros do Trabalho e da Administração –os funcionários públicos ameaçam greve geral.
Não vou entrar nos intrincados debates técnicos sobre a questão salarial dos trabalhadores públicos e privados. O ponto central é o seguinte: com inflação alta, não há mágica que funcione. Sempre (repito, sempre) haverá perda para os trabalhadores, independente da fórmula.
Fala-se muito (e com razão) da corrupção. Mas não existe maior roubalheira do que a inflação, esvaziando diariamente o bolso do trabalhador e deixando os indigentes ainda mais indigentes –é o pessoal que não tem conta em banco. O dinheiro é como se fosse uma barra de manteiga numa frigideira quente.
Agora mesmo estamos assistindo ao descalabro dos preços: os preços dos alimentos estão explodindo, os supermercados vivem uma fúria remarcatória. Perde mais justamente quem gasta a maior parte dos salário com alimentos, gente que não tem onde cortar.
O fato é que a maioria dos trabalhadores, por ignorância, omissão ou despreparo de seus dirigentes nunca se articulou para enfrentar as raízes da inflação. Até porque, em geral, não entendeu com precisão suas causas e a importância de se disciplinarem os gastos públicos. Por isso a ênfase é na elevação dos salários que, um minuto depois de ajustados, começam a perder valor.
É, em essência, mais uma consequência sinistra da falta de educação no Brasil.
PS: Na coluna de ontem, comentei sobre a impunidade dos médicos. Por falta de espaço, não coloquei uma sugestão. Os próprios médicos sérios ( e não faltam) deveriam fazer uma campanha publicitária, informando como o paciente, vítima do que imagina ser erro ou desleixo, poderia se queixar rapidamente. A idéia seria uma linha telefônica do tipo "SOS Criança", administrada pelo Conselho Regional de Medicina, registrando-se as reclamações.

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