São Paulo, terça-feira, 1 de março de 1994
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Vontade de ser feliz

LUIZ CAVERSAN

RIO DE JANEIRO – Aos trancos e barrancos, eis que mais uma vez o país tenta dar um passo em direção a um futuro mais feliz. O panorama é assustador: ameaça de greve, possibilidade de hiperinflação e descontrole de preços, perda salarial, nuvens negras para todos os lados.
Exercendo o direito de não estar a favor ou contra ninguém, gostaria aqui de remar contra a maré e –pasmem– manifestar meu otimismo. Por que não? Se há um artigo em falta no mercado hoje –todo tipo de mercado, diga-se– é o otimismo. Por que não ousar ainda que ingenuamente esperar que as coisas desta vez se ajeitem?
Como jornalista, este é o meu sétimo plano econômico. Vivi as euforias e frustrações de todos eles. Cansei a vista revisando tabela de congelamento da Sunab acreditando que ali estava a solução para acabar com o assalto ao bolso do trabalhador. Vi revoltado muita gente perdendo a cabeça por causa do confisco da poupança. Ajudei colegas desesperados para tentar entender, primeiro, para explicar, depois, no próprio jornal, o que estava ocorrendo.
Mas hoje nenhum desses sentimentos me assalta. Talvez seja algo como a tranquilidade ensandecida do suicida ao engatilhar a arma. Ou a apatia que sente o jogador profissional quebrado que coloca suas últimas fichas no vermelho, sabendo muito bem que o preto está ali e pode ser a cor escolhida pela bolinha da roleta.
Mas, e se a bolinha escolher, desta vez, a cor do Brasil? E se o equívocos do Plano FHC não forem tão equivocados assim? E se, após os percalços de praxe, este calhambeque chamado Brasil finalmente pegar ladeira abaixo e for em frente, fumacento e chacoalhante? Mas for.
Sonhar não custa nada ou quase nada. Os céticos e sérios –os sérios são extremamente necessários, como se sabe– dirão que tudo isso é bobagem, que faltam argumentos técnicos. Talvez seja apenas a necessidade de dizer que hoje me deu uma vontade tranquila, imensa e profunda de que desta vez dê certo.

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