São Paulo, quarta-feira, 2 de março de 1994
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Real terá lastro nas reservas cambiais

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

Ao contrário do cruzeiro e de todas mais recentes moedas brasileiras, que não passavam de papel pintado, o real terá lastro nas reservas do Banco Central em moeda forte e ouro e em ações de companhias estatais aceitas nos mercados internacionais. Isso significa que a cada real em circulação corresponderá um valor em moeda forte, ouro ou patrimônio da União. E esses valores poderão ser comprados a qualquer momento pelo real. Funcionando, o real será moeda forte e conversível.
Essa será a fase três do Plano FHC e, "sem dúvida, é a parte mais importante", comenta Francisco Vidal Luna, vice-presidente executivo do Banco SRL. A informação sobre as características da nova moeda consta apenas da Exposição de Motivos (EM) que introduz a Medida Provisória 434. Diz essa EM que a "emissão inicial de reais deverá ser suficiente para substituir integralmente a base monetária em cruzeiros reais". Base monetária é o papel moeda em poder do público, o dinheiro no bolso, mais as reservas que os bancos mantêm depositadas no Banco Central. Hoje, isso soma US$ 3,7 bilhões.
Pelas regras de emissão, o Banco Central, ao colocar em circulação os reais, especificará a quantidade de reservas em moeda forte e em ações de estatais que garantirá o valor (o lastro) da nova moeda brasileira. Essa parte das reservas ficará consignada - ou aplicada nos mercados internacionais "de forma prudente", diz a EM. E só poderá ser desbloqueada se for eliminada de circulação quantidade equivalente de reais.
Como as reservas do Banco Central hoje se aproximam dos US$ 35 bilhões, há sobra para garantir a primeira emissão de reais, mesmo considerando que, com a estabilidade, deve aumentar muito a moeda em poder de público. Como observa Vidal Luna, sem a desvalorização da moeda, as pessoas podem ficar com dinheiro no bolso, sem essas chateações de correr atrás de fundões.
Depois dessa primeira emissão, a regra para as seguintes permanece a mesma. O Banco Central só colocará mais reais na praça se tiver reservas para garantí-los. Essa regra estará na lei e tem enorme significado.
Hoje, o governo emite dinheiro praticamente sem restrições. Vai gastando os recursos que arrecadou com impostos e quando isso acaba, simplesmente emite mais cruzeiros e empurra esse papel pintado para o público. A moeda sem lastro determinado é chamada fiduciária - e indica que o público aceita a moeda e o valor nela especificado porque confia na capacidade de administração financeira do governo. Quando o governo passa a emitir a torto e a direito vai-se a confiança e vem a inflação. Como no Brasil.
Para restaurar a confiança, não basta o ministro Fernando Henrique Cardoso garantir que a nova moeda é boa. O público precisa ter garantias concretas. É o que se pretende fazer com o real, lastreando-se cada unidade da nova moeda em reservas fortes e em patrimônio da União.
Esse sistema, segundo Francisco Vidal Luna, significa que o governo deverá desenvolver a seguinte política: aplicar forte controle sobre a base monetária, para evitar sua expansão exagerada; manter juros positivos e atraentes o suficiente para que as pessoas deixem dinheiro aplicado em títulos em vez de trocar por moeda corrente; atrair investidores internacionais, que trarão dólares, os quais engordarão as reservas. E com mais reservas, o Banco Central poderá emitir mais reais.

Leia mais
a íntegra da Exposição de Motivos na pag.1-12

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