São Paulo, sábado, 5 de março de 1994
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TRECHOS DO ROTEIRO INÉDITO

SEQUÊNCIA 27
Pedro: Você pensa assim também, Maria?
Maria: Eu tenho uma fraqueza tão grande que não consigo pensar...
Pedro: Por que não chamou o doutor?
Tostão: Que doutor que nada... Ela tem mais é preguiça...
Pedro: Mano Tostão, tu é mesmo ruim. Antes tu não era ruim não, mas ficou pior que cascavel. Tu não tem pena de pai, de mãe, de irmão, de nada... De que é que tu tem pena, mano Tostão?
Tostão: Já vem você com essa choradeira de beato pra cima de mim.... Acontece que eu venci, mano Pedro. Hoje sou um homem bem pago, tá vendo minha roupa? Eu venci e não quero mais saber de miséria dos outros... não...
Pedro: Eu sei mano, eu sei que tu venceu na pior profissão que um homem pode ter...
Tostão: Pior que pistoleiro é ser ladrão. Eu sou um homem de honra, nunca roubei nem um pedaço de pão. Eu sou pistoleiro, mas só mato pela frente.

SEQUÊNCIA 32
Primeiro Plano de Viravante que roda a fita magnética do gravador de Carlinhos destruindo tudo e depois tira o filme da máquina e destrói.
Som: silêncio. Depois ouve-se, off, a voz de Villa-Negra.

Villa-Negra (off): O Sr. quer falar com o home, Dr.?
Viravante: Agora não... Diz pra Dona Isabel Tereza pra continuar o serviço até meia-noite...

Villa-Negra, nu da cintura para cima, vem dançando vibrando com um facão em volta de Isabel Tereza que também dança. Super close de Carlos, lhe metem um pau na boca, ele não pode gritar. Isabel Tereza dançando, Villa-Negra dançando, cortes rápidos. Isabel Tereza cai em transe.
Isabel Tereza no chão, espumando.

SEQUÊNCIA 36-A

Os negros encolhidos no canto começam a gritar.

Negros: Não abandone a gente sinhazinha, não abandone a gente sinhazinha...

Isabel Tereza, com o chicote, se aproxima dos negros e ergue o chicote. Os negros ficam em silêncio, com medo...
Carlos vergado, com dores, Isabel Tereza se aproxima dele.
Isabel Tereza de salto alto caminha pelas costas de Carlinhos.

Carlos da Silva: Pelo amor de Deus, a senhora quer me explicar? Eu não quero saber de mais nada com seu Viravante, eu já tinha desistido... a senhora sabe, eu estou morrendo de medo...

Isabel Tereza anda ajudada por uma negra para ajudar o equilíbrio.
Close dos saltos de Isabel Tereza nas costas de Carlinhos.

Isabel Tereza: Agora o mais difícil já passou. O que lhe falei é muito simples. Você é o homem que eu amo. Se você me ajuda a matar Viravante eu herdo toda a fortuna dele, liberto estes negros escravos e vamos viver juntos e felizes...
Carlos da Silva: A senhora pode repetir isto cem vezes que eu não acredito.
Isabel Tereza: A realidade está por fora e por dentro das coisas. Você anda pela rua e pensa que está vendo a realidade mas a realidade é meu sofrimento de quatro séculos presa nesta sala. No meu coração estão as raízes e destas raízes surge a nova verdade...

SEQUÊNCIA 48

Travelling: Pela sala da casa de Viravante, que anda gritando, com Mr. Flower e o secretário atrás.

Viravante: Eu perdi trinta anos cultivando os mais nobres ideais! Eu sou um homem de talento, um homem de talento! Se eu não pensasse em ser presidente, eu poderia ter pensado em ser um grande escritor, um grande poeta. E agora aqui estou servindo de tapete, latindo como cachorro sem dono, submisso, escravo, derrotado!
Mr. Flower: Não se desespere Mr. Viravante... Não se desespere que eu tenho uma solução... Não se desespere, Mr. Viravante...
Viravante: Mas que solução? Não ha mais nenhuma solução depois de cinquenta anos, não há nenhuma solução depois que o tempo come a alma e as carnes do homem!

Mr. Flower pergunta ao secretário o significado da palavra tapete

SEQUÊNCIA 70

Close-up de Viravante.

Viravante: Tome na cara, subdesenvolvido. Tome na cara! Colonizado. Tome na cara, fraco. Tome escravo.

Plano geral de Carlinhos com a arma na mão. Viravante berra.

Viravante: Aristocratas ou povo, entendeu? Abaixa esta arma, fica de joelho, pede perdão, vai, vai.

Começa um travelling.

Viravante: Eu não vou te entregar pra polícia, não vou te matar... Eu vou te comprar pra você saber que eu compro tudo... Eu compro a carne e compro a consciência... Isabel Tereza! Isabel Tereza!

Plano médio: Viravante com Villa-Negra junto ao peito diz baixo:

Viravante: Os apocalíticos serão varados de bala, enforcados e queimados. Minha biografia é tua negação: eu sou a tua verdade que renasce das cinzas.

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