São Paulo, domingo, 6 de março de 1994 |
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Maravalhas reconstrói o sujeito
CARLOS UCHÔA FAGUNDES JR.
Ele pinta miniaturas sobre velhas cédulas de dinheiro e quadros pequenos, figurativos, impregnados por imagens que lhe surgem nos momentos fluidos entre a vigília e o sono. Sonhos ou alucinações, definem uma obra peculiar e afirmativa, que parece não brotar de ingenuidade ou deficiência de informação. Ao contrário, Maravalhas é Mestre em Artes pelo Art Institute de Chicago e professor de pintura da Universidade de Brasília. O que dizer de uma pintura figurativa com dimensões diminutas, formas bem desenhadas, adequado trabalho de pincel e cor, com uma atmosfera algo "naif", mas profundamente atormentada, com uma espacialidade toda própria, como se brotasse de um espelho convexo, e uma luz elaborada, que completa sua personalidade? Talvez alguns modernistas dos primeiros momentos pudessem acolhê-la como extrema novidade, com um rasgo de inventividade difícil de classificar, mas intuitivamente inovadora. Assim Picasso celebrou Henri Rousseau, o "douanier". Hoje, porém, quando a arte parece ter se livrado do "novo" e de todas as "grandes linhas", os "ismos", resta sempre o perigo do olho "escolar", vincado pelas vanguardas. É difícil compreender certas produções que o desafiam, correndo o risco de empurrá-las logo para outros mundos anacrônicos que não o olimpo da "arte contemporânea". Para Maravalhas, suas telas são capítulos de um livro. Plasticamente, reconstrói a perspectiva sob uma ótica curva, onde o espaço se torce em torno de um grande vazio central. O sujeito tenta, através da pintura, reabastecer-se de certezas, registrando seu mundo doméstico com sensualidade, mas tudo reconduz ao pesadelo do vazio. São iluminuras delicadas feitas sobre dinheiro velho. Arriscando cair fora do olimpo, a obra de Maravalhas repõe muitas tramas do sujeito com algumas inegáveis qualidades plásticas. Exposição: Xamãs, haverão? Artista: Nelson Maravalhas Onde: MAC Ibirapuera (Pavilhão Bienal 3º piso, Parque Ibirapuera) Quando: Até hoje, das 12h às 18h Texto Anterior: Teatro cheira a mofo Índice |
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