São Paulo, sexta-feira, 11 de março de 1994
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A raposa e o galinheiro

SERGIO GARDENGHI SUIAMA

Em artigo publicado neste espaço, o secretário municipal do Meio Ambiente, Werner Zulauf, invocou para o Conselho do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Município (Cades) competência exclusiva para apreciar os Estudos e Relatórios de Impacto Ambiental dos projetos e obras propostos na cidade, em especial a Operação Faria Lima.
O secretário alega um suposto "direito legal e constitucional" da prefeitura para licenciar, com exclusividade, empreendimentos causadores de impactos ambientais. Subjetivismos à parte, a análise da Constituição e da legislação ambiental não nos permite chegar à mesma conclusão.
O artigo 225 enuncia: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, (...) impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". O dispositivo permite depreender a competência da União, Estados, Distrito Federal e municípios na proteção do meio ambiente, através da atuação conjunta, coordenada por uma política nacional.
Em relação ao Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (Eia/Rima), a legislação confere aos órgãos estaduais a competência para aprová-los, não se sustentando a posição do secretário em defender competência exclusiva do município.
A necessidade de apreciação do Estudo pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) fica, em relação ao projeto Faria Lima, mais evidente, pois o impacto causado pela operação transcende os interesses do município. A área afetada se localiza na bacia hidrográfica do rio Pinheiros, próximo à represa Billings, fonte de abastecimento de água da Grande São Paulo. O impacto das obras precisaria ser avaliado pelo órgão estadual competente.
Uma última consideração: ao proclamar que o Cades é "multidisciplinar e paritário", esqueceu-se Zulauf de mencionar que o Conselho Municipal não tem poder deliberativo, configurando-se apenas como órgão de consulta do secretário, cabendo a este último aprovar ou rejeitar o Eia/Rima dos empreendimentos localizados no município, assegurado o reexame de ofício pelo prefeito. Ou seja, com esta estrutura, o Cades é simples órgão decorativo. O exemplo da Faria Lima é revelador: ainda que o Conselho e o próprio secretário rejeitassem o Eia/Rima, o prefeito poderia conceder licença para o projeto.
Não se objetiva aqui negar a competência do município para ordenar a proteção ao meio ambiente em seu território; o que não é possível é deixar a raposa tomando conta do galinheiro.

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