São Paulo, segunda-feira, 14 de março de 1994
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O PSDB na encruzilhada

JUTAHY MAGALHÃES

Para Maquiavel, a virtude é a capacidade do príncipe forte e sagaz que, usando das artes da raposa e do leão, triunfa no intento de manter e consolidar o próprio domínio. Para São Tomás de Aquino, "o fim não é causa de outras coisas, mas sim causado por elas". Entre um e outro, fico com o segundo.
Dentro dos princípios éticos que sempre me guiaram, tanto na vida pessoal quanto parlamentar, não há lugar para o pragmatismo. Em questão de moral, não aceito a máxima maquiavélica de que "o fim justifica os meios". Uma ação política há de ser praticada não com outro fim senão o de cumprir com o próprio dever, o dever da consciência.
Consciente do meu dever e confiante em meus companheiros, não acredito que o PSDB venha a trair seus eleitores, juntando-se a pessoas descompromissadas com a ética e a moral. Pelas suas próprias raízes, também não creio que o PSDB se deixe confundir com um partido de ideologia diversa, cujo programa é essencialmente conflitante com o nosso. Nada justificaria falsear a verdade, enganando os militantes do partido, a fim de vencer as eleições.
O PSDB nasceu na adversidade, durante a Constituinte. Seus fundadores se sentiam impossibilitados, dentro dos quadros partidários a que pertenciam, de defender os ideais e os compromissos firmados em praça pública.
Partidos de verdade não se criam por acaso. Fatos graves estavam acontecendo. Para a aprovação dos cinco anos de mandato, o fisiologismo se manifestara através da farta distribuição de canais de rádio e televisão. A postergação das eleições presidenciais, no entanto, resultou na união de parlamentares e lideranças estaduais em torno da ética na política.
Hoje, o PSDB é um partido que dispõe de nomes reconhecidos na política brasileira. Nomes que passaram a ser cobiçados por outros partidos que, não tendo candidatos próprios, tentam apoiar-se no candidato do PSDB. Em nome do interesse nacional, a elite pragmática, há anos no poder, busca mantê-lo a qualquer custo. É inadmissível que o PSDB se preste a dar credibilidade a essa elite que levou o país à situação atual. Enquanto se vangloriavam com índices de desenvolvimento econômico, crescia a miséria de um povo que hoje apresenta uma das piores distribuições de renda do mundo.
Eis a verdade: a direita não encontrou seu candidato, um nome que defenda suas idéias e obtenha apoio popular, mesmo com a mídia a seu favor. Um exemplo do pragmatismo dominante é o fato de que, se o plano econômico der certo, nem o PSDB nem Fernando Henrique Cardoso ficarão na dependência de qualquer aliança com o governador da Bahia. Se não der certo, aí eles é que não vão querer qualquer aproximação com o PSDB ou com seu candidato.
Trata-se de uma nova encruzilhada para o PSDB. Um movimento semelhante ao que se fez há bem pouco tempo, quando tentaram levar o PSDB a apoiar o governo Collor. Na ocasião, combati veementemente –inclusive aqui, na Folha– o maior erro político que o PSDB poderia cometer. Conseguimos evitar o equívoco, com o apoio de muitos e a firmeza do grande líder Mário Covas. Agora, confiante nos mesmos companheiros e sob a mesma liderança, espero que o PSDB não escolha o caminho errado.
Um caminho errado, na medida em que se esquecem decisões consagradas pelo congresso do PSDB, de que as alianças se fariam apenas com partidos ideologicamente semelhantes. O que não ocorre com o PFL, um símbolo da continuidade do clientelismo e do fisiologismo, um partido adaptável a qualquer governo, contanto que permaneça sempre perto do poder.
Os segmentos do PSDB que cogitam da referida aliança já se dispuseram a refletir sobre o alto preço a ser pago, em troca de uma hipotética vitória? Como ficaria o candidato do PSDB, caso vitorioso? Tornar-se-ia prisioneiro de uma direita retrógrada, sem condições de estabelecer um plano de governo condizente com a linha política do partido.
Por que estaria o sr. Antônio Carlos Magalhães, dono de incontestável poder junto aos meios de comunicação, rastejando por uma posição junto ao PSDB? Assim como o nome de Orestes Quércia não nos convém, por motivos idênticos não podemos aceitar despudoradamente o nome do sr. ACM ligado ao PSDB.
E se –por ironia ou por via de consequência– sobreviver o fracasso eleitoral? Uma união como essa dificilmente seria digerida pelo eleitor. Mesmo inexistindo a conscientização política desejada, o povo brasileiro está escaldado. Na hora de votar, vai empenhar-se ao máximo para acertar. Vai exigir a garantia de que seu voto não será traído.
Independentemente de quaisquer interesses regionais ou pessoais, nós, do PSDB da Bahia, somos contrários a essa aliança, e lutaremos contra ela. Para nós, só há um caminho –aquele que nos leva, movidos por princípios éticos, aos compromissos assumidos com o eleitor. Repudiamos firmemente a infidelidade aos princípios do partido.
O PSDB surgiu como alternativa partidária, uma promessa de reformas no cenário político brasileiro. Assim deve prosseguir. Sem confundir transformações necessárias ao país com articulações indecorosas que envergonham aqueles que ainda se mantêm íntegros.

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