São Paulo, terça-feira, 15 de março de 1994
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Cartilha transforma governo no lobo mau

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A cartilha sobre cidadania com personagens da Turma da Mônica comete um erro básico de Teoria Política e outro, fundamental, de Teoria Econômica. Politicamente, dá a entender que cidadania é apenas um produto da solidariedade bem aventurada dos indivíduos, não um processo de conquista de direitos a serem garantidos pelo próprio Estado. Economicamente, repete o erro noutro nível, ao concentrar as culpas da inflação no governo deficitário, que gasta mais do que arrecada.
Cidadania é um processo de mobilização onde o que está em jogo não é apenas "fazer o bem ao próximo" mas construir instituições e regras. É geralmente parte de uma história de conquistas. A cartilha dá a entender que a simples boa vontade de cada um garante proteção contra o crime. Nunca foi assim, menos ainda no Brasil. Mas como o objetivo da cartilha é pulverizar a imagem do Estado, a imagem ingênua é repetida à exaustão. No limite, a cidadania estaria embutida em cada um. Ser cidadão seria o mesmo que trazer à luz faculdades típicas de uma condição natural abafada por maus costumes.
Na economia vale a mesma ingenuidade. Não há oligopólios, não há protecionismo, nada que remeta à necessidade de ação do Estado. Mais uma vez bastaria aplicar a lógica de uma dona de casa a problemas de ordem pública. Na economia como na política, a cartilha sugere que não existe de verdade uma ordem pública, apenas a soma de "boas vontades" individuais.

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