São Paulo, terça-feira, 15 de março de 1994
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URV na garganta

A transição para a nova moeda engasgou. O assessor da Fazenda José Milton Dallari anunciou ontem que deve ser adiado o uso da Unidade Real de Valor (URV) nas operações a prazo realizadas entre a indústria e o comércio. A URV nasceu com a incumbência de simultaneamente anular o passado e o futuro do sistema de preços. Surgia um índice que –nas formulações da equipe econômica– ganhava o bastante sugestivo apelido de "indexador contemporâneo".
Houve suspense sobre como, afinal, seria o governo capaz de criar um indexador sem passado nem futuro, sem inércia nem especulação. Lançada a URV, em vez de um "indexador contemporâneo", a equipe saiu-se com um índice a mais que apenas reflete a inflação passada. A MP 434 exigia ainda que todas as obrigações contraídas a partir de 15 de março para vencimento em mais de 30 dias viessem obrigatoriamente expressas em URV. Hoje seria, portanto, um dia decisivo.
Seria se, na prática, tivessem os agentes vislumbrado na URV não a sabedoria atemporal dos acadêmicos, mas a possibilidade objetiva de tocar seus negócios. Ocorre que a adesão à URV tem sido insuficiente, por não haver regras suficientemente claras para adotá-la em contratos a prazo. Teme-se ainda uma inflação em URV. Não há sequer garantias de que, no Congresso, a correção monetária venha a ser de fato eliminada da política salarial.
O próprio governo percebeu, tardiamente, a confusão prática decorrente do brilhantismo conceitual que inspirou a URV. Apenas um dia útil antes do Dia D veio o Ministério da Fazenda subordinar uma MP, aliás ainda sujeita a dúvidas, a uma portaria ministerial obrigando a inserir a URV nos contratos a prazo.
A confusão no Dia D, portanto, decorre da falta de clareza nas ações do próprio governo. Com menos garantias de que a equipe saiba afinal o porquê e o como das regras que deseja, tendo que cotejar MPs e portarias do Ministério da Fazenda para saber como agir, cada agente econômico e cada formador de preços é obrigado a nervosamente aguardar, sem saber o que fazer, com a URV pela garganta.

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