São Paulo, sábado, 19 de março de 1994
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D. Aloísio e a violência

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Nestes dias o Brasil viveu a solidariedade com d. Aloísio e os reféns, a ação das autoridades e da polícia e, mais uma vez, a situação dos presidiários.
D. Aloísio, seus bispos auxiliares e companheiros nos deram a lição do amor de quem vai aos detentos para ajudá-los, com a presença e a palavra. Não era a primeira vez. Para o cardeal de Fortaleza, a preocupação com os presos, com seu bem espiritual e as condições do presídio, é constante. Tem procurado, por meio dos membros da Pastoral Carcerária, que haja um atendimento humanitário aos que estão na prisão.
O que aconteceu, todos sabemos. No entanto, a agressão do grupo de detentos não foi aprovada por seus companheiros, que sempre respeitaram os membros da pastoral. D. Aloísio é conhecido como pastor dedicado aos pobres, solícito dos mais necessitados e defensor de seus direitos.
Houve muita oração nas comunidades. Desde o primeiro momento, reuniram-se as crianças nas escolas e muitos fiéis nas igrejas para pedir a Deus a proteção das vidas e uma solução pacífica.
Apesar das ameaças, da agressão física, do cansaço e desconforto, conseguiu o cardeal d. Aloísio dar exemplo de confiança em Deus, coragem, e profundo amor aos que o atacavam. Na fuga, ia rezando com seus raptores e pedindo a Deus por eles, preocupado mais com os reféns, os policiais e detentos do que com a sua própria vida.
Agradecemos a proteção divina e a moderação das autoridades que evitou o desatino de imprudências e chacinas. Tenho a certeza de que d. Aloísio continuará a ser como é. Esquecido das quatro vezes em que foi operado no coração, dedicado a todos, irá de novo visitar os detentos, zelar pelos seus direitos e confortar suas famílias.
Temos que considerar as causas do que aconteceu.
Há um clima de violência generalizada, agravado pela permissividade moral, sem freio que gera o descaso pela pessoa humana. Aumentou o uso da violência contra o nascituro e a criança. Multiplicam-se os furtos, sequestros, abusos sexuais e crimes passionais. A prática política, ligada a interesses pessoais e corporativos, faz crescer a desesperança. Que pensar da insensibilidade dos congressistas que votaram pelo aumento de seus vencimentos? Para evitar a desorganização social, temos todos que reforçar os valores da convivência pacífica, o respeito às leis e às instituições que devem garantir a democracia no Brasil.
Outra causa que não pode ser esquecida é a situação inaceitável de nossos presídios. Faltam as condições mínimas para seres humanos. Lotação excessiva. Morosidade nos processos. Higiene e alimentação precárias. Violência entre os presos. Abusos no policiamento. As novas normas antiviolência, apresentadas pelo ministro da Justiça, prevêem um melhor atendimento carcerário. É urgente sua aplicação. Que o sacrifício e o belíssimo exemplo de d. Aloísio e seus companheiros alcancem de Deus a mudança de nossa conduta e a superação de toda violência.

D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

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