São Paulo, terça-feira, 22 de março de 1994
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Brasil edita guia sexual mais ousado que os EUA

MAURICIO STYCER
DA REPORTAGEM LOCAL

Os Estados Unidos têm muito a aprender com o Brasil em matéria de sexualidade e orientação sexual nas escolas. A opinião é do norte-americano William Yarber, consultor internacional de uma importante organização não-governamental especializada no assunto, a Siecus (Sex Information and Education Council of United States - Conselho de Informação e Educação Sexual dos EUA).
Yarber está em São Paulo para participar do lançamento do "Guia de Orientação Sexual", a versão brasileira de um volume produzido em 1991, sob sua coordenação, pelo Siecus. O guia está em terceira edição nos EUA e chega às livrarias brasileiras com uma primeira edição de 5.000 exemplares (edição da Casa do Psicólogo, preço equivalente a US$ 7).
O guia tem o objetivo de oferecer diretrizes a professores interessados em discutir com seus alunos, temas considerados "difíceis" pela grande maioria das escolas. O texto, com orientações diferentes segundo a idade dos alunos, aborda questões como homossexualidade, aborto, masturbação e o uso de proteções de látex na prática de sexo oral (veja trechos no quadro ao lado), entre outros.
Por pressão de entidades religiosas, o guia norte-americano, por exemplo, preconiza a abstinência sexual como a melhor forma de adolescentes evitarem a contaminação pelo vírus da Aids. O guia brasileiro rejeita essa fórmula e sugere que o professor discuta em classe as diferentes formas de evitar a transmissão do vírus, como o uso de camisinha e a prática de masturbação com o parceiro.
No capítulo sobre namoro, o guia brasileiro apresenta o conceito de "ficar", dizendo a crianças de 9 a 12 anos que é "um relacionamento amoroso eventual e sem compromisso". O guia americano diz: "Adolescentes e adultos frequentemente têm vários relacionamentos românticos."
"No Brasil há uma aceitação muito maior da idéia que a sexualidade é uma coisa natural. Apesar da revolução sexual, a maioria dos norte-americanos ainda sente desconforto em discutir temas ligados a sexo", diz William Yarber.
"Com esse guia, a professorinha lá no Piauí vai poder fazer um trabalho menos ruim do que faria sem ele", acredita Marta Suplicy, coordenadora do GTPOS (Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual), uma das três ONGs brasileiras que lideraram o projeto.
Cerca de 30 entidades participaram, em 1993, de um fórum destinado a discutir a versão brasileira do guia. Representantes da Igreja católica, que haviam acompanhado as discussões, não endossaram a inclusão de temas como aborto e retiraram o seu apoio ao projeto.
A coordenação do guia exibe como grande trunfo o resultado de uma pesquisa nacional do Datafolha divulgada em junho de 1993, na qual 86% dos entrevistados defendem a inclusão de programas de educação sexual nas escolas.

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