São Paulo, quarta-feira, 23 de março de 1994
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"Feitiço do Tempo" se redime pelo humor

RICARDO CALIL
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

Em sua longa carreira nos cinemas de São Paulo, onde permaneceu em cartaz por seis meses, "Feitiço do Tempo" alcançou o status de "cult" sem recorrer a artifícios como receitas culinárias, ventiladores ou "serial killers". Lançada agora em vídeo, a comédia romântica de Harold Ramis comprova seus méritos, baseados em seu engenhoso roteiro, que dosa humor e sentimentalismo na medida certa, e em seus protagonistas, Bill Murray e Andie MacDowell. Ramis e Murray já haviam trabalhado juntos em "Os Caça-Fantasmas 1 e 2", ambos como atores.
"Feitiço do Tempo" remete diretamente às comédias do cineasta americano de origem italiana Frank Capra, como "Aconteceu Naquela Noite" (1934) e "Do Mundo Nada se Leva" (1938), em que a crítica social e a crença na redenção do indivíduo caminham juntos. O filme conta a história do egocêntrico e mal humorado Phil Connors (Bill Murray), homem do tempo de uma pequena emissora de TV, espécie de moderno mr. Scrooge (o rabugento de "Oliver Twist", de Charles Dickens).
Pelo quarto ano consecutivo, Phill é enviado, junto com sua produtora Rita (Andie MacDowell) e um cameraman, para a pequena cidade de Punxsutawney (Pensilvânia) para cobrir as festividades do Dia da Marmota (o "Groundhog Day" do título original), em 2 de fevereiro. Segundo a lenda local, a marmota, também chamada Phill, tem o poder de prever o tempo. Se o animal olhar sua própria sombra, pode-se esperar mais seis semanas de inverno.
Depois de encontrar um insuportável colega que se tornou vendedor de seguros, pisar numa poça de água, ficar preso na cidade que mais detesta devido a uma tempestade, Phill vai para a cama depois de um banho frio. OK, todos têm um dia ruim de vez em quando. Mas, quando acorda no dia "seguinte", Phill está novamente no Dia da Marmota. E o dia 2 de fevereiro continua se repetindo independentemente dos acontecimentos de "ontem".
A questão essencial do filme se volta então para a pergunta: "E se não houvesse amanhã?". Phill tenta várias alternativas: a) aproveitar a "impunidade" da situação, por exemplo pedindo uma mulher em casamento apenas para seduzí-la; b) entrar em depressão, o que inclui as mais diversas tentativas de suicídio; c) tentar provar que não está louco, antecipando o que vai acontecer durante o dia.
Em qualquer das alternativas, Phill Connors será sempre acordado na manhã fria do dia 2 de fevereiro pelo rádio-relógio de seu hotel, que estará tocando novamente "I Got You Babe", com a dupla Sonny & Cher.
Depois de sobreviver à sua "via crucis", Phill parece pronto para a redenção. O homem do tempo percebe que, se não pode reverter sua situação, deve mudar a si mesmo. E sua regeneração pode se dar pelo amor e pelo humor. Para isso, Phill deve abandonar a razão (a meteorologia) pela fé (a lenda da marmota), trocar o mau humor pela boa vontade. Afinal, ele pode aprender a tocar piano como Jerry Lee Lewis em apenas um dia.
Ao escolher o tom de fábula, o roteiro de Danny Rubin e do próprio Ramis consegue apontar esse caminho sem escorregar nas armadilhas do sentimentalismo gratuito. Conta com a ajuda de Bill Murray, que demonstra suas qualidades de comediante, quase sempre ocultas em outros filmes.

Filme: Feitiço do Tempo (Groundhog Day)
Direção: Harold Ramis
Elenco: Bill Murray e Andie MacDowell
Distribuidora: LK-Tel Video

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